segunda-feira, 5 de novembro de 2012

"O Segredo da Cabana" me convenceu de que metalinguagem nem sempre é muleta de cineasta pretensioso



Não dei muita atenção a Cabin in the Woods quando este foi lançado porque me pareceu, basicamente, uma versão requentada de Evil Dead. A pegadinha seria a presença de um elemento meta, o que considero sempre um péssimo sinal, pois a História demonstra que metalinguagem, via de regra, consiste em cop-out de diretor ou roteirista pretensiosos e preguiçosos (exemplo: Identidade). O Segredo da Cabana, contudo, mostrou-se a exceção que confirma a regra e provou que eu estava errado quando descartei o Joss Whedon como "hype sem fundamento". Tal juízo foi formado depois de ver Alien Ressurection, que, mais tarde descobri, havia jogado as melhores idéia do roteiro do Boy Wonder na privada. Além disso, sempre achei a Buffy uma versão emo-de-calcinha do Blade e nunca entendi o fascínio que muitas pessoas, cuja opinião respeito, têm pela série (ou atribuo tal fascínio ao fato à presença do "fator calcinha" da fórmula). A constatação de que Alien 4 submeteu o roteiro de Whedon a uma distorção tremenda, somada ao respeito que passei a nutrir pelo diretor/roteirista após assistir ao foderoso Os Vingadores (que, contrariando minhas expectativas, cumpriu com louvou tudo a que se propôs), bem como opiniões extremamente positivas ventiladas por amigos, me levaram a ver Cabin com boa vontade. Tenho que admitir que estou entendendo por que o Joss Whedon é um "fenômeno" nerd e, francamente, fiquei inclinado a dar uma segunda chance Buffy, Firefly e Serenity.

Para não estragar o filme, terei que, excepcionalmente, abordar a trama de forma sintética (motivo pelo qual enrolei tanto para escrever este post após ver o filme - escrever com concisão é, para mim, muito mais exaustivo do que divagar interminavelmente sobre o obra). Começamos o filme com dois focos de narrativa aparentemente paralelos que, posteriormente, irão se mostrar parte de um todo. Parte da trama segue um grupo de cinco amigos (Chris Hemsworth, Kristen Connolly, Anna Hutchison, Fran Kranz e Jesse Williams) que vai passar um feriado na cabana do título; entrementes, um grupo de trabalhadores de colarinho branco está, aparentemente, prestes a acompanhar um evento de relevância notável. Com o desenrolar do filme, o "evento" se revela ser o feriado dos cinco amigos supracitados. Tal feriado, por sua vez, acaba se mostrando uma colossal roubada quando nossos heróis, acidentalmente, encontram um livro altamente suspeito no porão da cabana e (OOOOOH!)...

"Pode ler a parte em latim. Esse trecho aí, que parece ser um feitiço. Isso nunca acabou em desgraça..." Bruce Campbell

... acabam despertando um clã de zumbis antropófagos. Será que eles sobreviverão? Não se depender do pessoal de escritório, que está acompanhando todo o baculejo sofrido pelos mancebos e interferindo para garantir que os monstros dêem cabo de todo mundo ou, pelo menos, de quase todo mundo. Por que? A explicação é lovecraftiana (mesmo; Cthullu não faz uma participação especial, mas por pouco), mas faz todo slasher movie que leva o espectador a se emputecer com as decisões retardadas dos personagens ou se entediar com os tipos (e.g., a final girl "casta" e o engraçadinho que tanta passar por comic relief), a fazer sentido. E isso é só o que posso dizer sobre a trama.

Há dezesseis anos, quando o Pânico de Wes Craven saiu nos cinemas, achei meio irônico o fato de que a publicidade do filme o divulgou (e a crítica engoliu) como uma "paródia" aos slasher films. A ironia residia no fato de que o filme seguia, religiosamente, a fórmula manjada de uma centena de slasher movies que haviam sido lançados 10, 15 anos antes, apresentando, como única diferença, algumas piadinhas autorreferenciais. Prova disso é que o sucesso do filme ensejou uma onda de slasher films que seguiam todos os clichês que o filme do Craven supostamente satirizava. Ensejou, também, entre as distribuidoras de filmes, a insuportável mania de colocar a palavra "pânico" no título nacional de qualquer filme de terror. Exemplo? "O filme é de terror? A história se passa numa ilha? Então vamos chamá-lo de 'Pânico na Ilha'! A história se passa num barco? 'Pânico no Barco'! A história se passa num hotel? 'Pânico no Hotel!' A história se passa na zona rural? 'Pânico no Mato'!"  Nem precisava ser filme de terror.

Se este filme, por exemplo, tivesse sido lançado 20 anos depois, teria o título nacional de "Pânico na Delegacia"
Sério. Isso é chato pra caralho. Lembra a onda de "A Hora de Não-Sei-o-Que" dos anos 80. Parem de ficar adaptando todo título de filme de sucesso a outros, a fim de atrair os idiotas. Não inventem de intitular o próximo filme de ação do Michael Bay de Os Missionários. Se fizerem um filme que se passa no município de Gravatá, pelo amor de Deus, não batizem a obra de Gravatar. Os idiotas vão assistir a filmes fuleiros de qualquer jeito (exemplo: a carreira do Michael Bay). Esse artifício é completamente desnecessário e só serve para irritar.

Mas eu divago. O ponto é o seguinte: O Segredo da Cabana é a paródia a filmes de terror que Pânico alegava ser - o roteiro explora todos os clichês do gênero e se sai com explicações simultaneamente hilariantes e convincentes para sua reiteração (o "maluco-cujas-advertências-são-ignoradas" Mordecai me matou de rir com o "Am I on the speakerphone? Yes I am! I can hear the echo!"). É um dos poucos casos de metalinguagem em que o roteirista e diretor parecem estar rindo com o espectador, não usando o recurso como forma cretina de demonstrar sua pretensa superioridade artística e intelectual e amarrar pontas que se mostraram difíceis demais para se resolver de forma lógica (eu realmente odiei Identidade). O fato de o filme, ao contrário dos slashers padrão, ter bons atores e personagens que realmente têm personalidades, ao invés de um bando de clichês desagradáveis ambulantes, também facilita bastante a empatia do espectador e fazem com que a obra, mesmo quando não está sacaneando com a fórmula, prenda a atenção e não reduz Cabin a uma piada que só tem graça para fãs de cinema de terror - há, afinal, uma diferença entre paródia e comédia.  Além de tudo isso, fechando com chave de ouro, o filme não inspirou, para meu alívio, uma onda de títulos com "segredo" ou "cabana", pois tal efeito teria me inspirado a cometer uma série de assassinatos com requintes de crueldade. E, alguns anos mais tarde, depois que polícia me matasse, quando alguém resolvesse fazer um filme sobre meu surto homicida, o título provavelmente seria "O Segredo do Assassino" ou "O Matador da Cabana" (embora eu não tenha nada nem remotamente parecido com uma cabana), o que seria, por sua vez, totalmente sem futuro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário