domingo, 21 de junho de 2009

Terminator Salvation: Você Não Vale Nada, Mas Eu Gosto de Você


Isso mesmo. Pode sacanear. Estou escrevendo um post usando o título de uma música de Dorgival Dantas. Pode ser considerado (e eu considero) bastante imbecil, mas explica perfeitamente minha relação com este filme. Podia ser pior: se eu tivesse escolhido um hino de corno do Amado Batista ou alguma mela-cueca do Alexandre Pires, a pertinência temática seria a mesma.

O filme, submetido a uma análise mais detida, é uma porcaria. A primeira vez que assisti, minha conclusão foi, basicamente: "as cenas de ação são do caralho (inacreditável que tenham sido dirigidas por um picareta do calibre do tal "McG"), Bryce Dallas Howard e Moon Bloodgood são gostosas, Christian Bale e Sam Worthington são fodões, o Arnoldão CGI e Michael Ironside são totalmente kickass, mas a premissa do roteiro é essencialmente imbecil e a caracterização é quase nula." Enfim, terminei com a sensação de que o filme até que deu pro gasto (principalmente porque minhas expectativas não eram das melhores), mas não o suficiente para ver outra vez.

Entretanto, uma série de fatores conspiraram para resultar na minha doentia relação de atração/repulsa por esta "obra". Primeiro, foram as súplicas desesperadas de milhares de fãs deste blog. Com "milhares de fãs", quero dizer, na verdade, o Just Daniel, do Nascido em 29 de Março, um dos quatro ou cinco bem-aventurados que, creio eu, acompanham este site quando a única alternativa viável de entretenimento é ver tinta secar. Por "súplicas desesperadas", entenda-se que o Danny Boy deixou uma mensagem perguntando se ia ter post sobre o filme e dizendo que estava a fim de debater a série com alguém. Respondi com um comentário sucinto (para meus padrões), não muito diferente do parágrafo anterior, ao que o JD replicou suscitando alguns pontos bastante interessantes. Em seguida vieram os posts do Ronald Perrone e do Felipe Guerra. O primeiro apresentou uma visão bem mais positiva do filme que a minha; o segundo apontou buracos ainda mais escabrosos no roteiro do que eu havia percebido. Tudo isso, somado à minha compulsão de sempre ver qualquer filme pelo menos duas vezes (minha opinião definitiva geralmente só se forma assim), acabou me levando a assistir a Terminator Salvation mais uma vez. E para minha surpresa, um estranho fenômeno, até então inédito em meu contato com o cinema, ocorreu: concluí que o filme era uma porcaria ainda mais lastimável do que eu havia pensado da primeira vez e, ao mesmo tempo, percebi que também gostei ainda mais do filme na segunda vez que assisti. E tenho certeza que voltarei a vê-lo. E acabarei comprando o DVD.

Devo esclarecer que não gostei do filme da maneira como gosto, por exemplo, de The Incredible Melting Man. Gostei genuinamente desta porcaria. Poucas vezes na vida meu intelecto e meus sentidos sofreram tamanho conflito. Como um corno manso que insiste em manter seu "relacionamento" com a maior vadia do bairro, embora esta ataque descaradamente qualquer coisa que tenha um pênis, cheguei à amarga conclusão de que adoro este filme, mesmo reconhecendo que se trata de uma típica porcaria caça-níqueis hollywoodiana. Como explicar tamanha inconsistência? Não sei. Só sei que é para desvendar tal mistério que, cerca de dois meses após praticamente todo mundo já ter visto e esquecido o filme, vou analisá-lo em mais um "texto interminável", como costumam dizer meus milhares de fãs (mais uma vez: "milhares de fãs"="JD e Ronald Perrone, que passam bem longe do conceito convencional de 'fã' " e "costumam dizer"="comentaram uma ou duas vezes").

O filme se inicia em 2003, com uma cena onde somos apresentados a Marcus Wright, (Sam Worthington), hóspede do corredor da morte na iminência de descobrir se a injeção letal é mesmo indolor, e a Dra. Serena Kogan (Helena Bonham-Carter), que tenta convencê-lo a assinar um documento permitindo que seu presunto seja usado em pesquisas científicas após sua execução. Marcus, ao contrário da maioria dos inquilinos de sua ala, não está nem um pouco interessado em procrastinar o cumprimento da pena e nem em ter uma "segunda chance" (argumento utilizado pela cientista para persuadí-lo) - o rapaz parece concordar plenamente com a sentença que recebeu. Finalmente, ele acede, em troca de um beijo da obviamente moribunda Dra. Kogan ("Então é esse o gosto da morte", observa o cidadão, após o amasso), e encerra a conversa afirmando, com todo seu joie de vivre: "Sou culpado. Corte-me até não restar nada." Segue-se a execução do personagem.

É uma boa sequência de abertura. Em primeiro lugar, deixa o espectador perdido - a cena se passa em 2003, aproximadamente pouco antes ou durante os eventos do T3, mas nenhum dos personagens parece ter qualquer relação com a continuidade da série - até Kogan sair e percebermos que a autorização assinada por Marcus cede seu corpo à Cyberdine Systems. As interpretações são decentes e o personagem de Wright, em particular, é intrigante. Trata-se de um daqueles raros casos em que o ator faz os sentimentos de remorso e repugnância por si mesmo do personagem parecerem genuínos e não uma frescura emo. O único outro caso recente que me vem à cabeça é o Budd de Michael Madsen em Kill Bill. Contribui para prender a atenção do espectador o fato de nunca ficar claro em que consistiu seu crime - ele apenas alude ao fato de ter provocado a morte de seu irmão e dois policiais. E, é óbvio, o personagem deve ter algum papel relevante na trama - afinal, por que outro motivo começariam o filme com essa sequência?

Corta para 2018, quando o holocausto nuclear provocado pelas máquinas já aconteceu e a guerra entre estas e a humanidade (com franca desvantagem para a humanidade) está em andamento. John Connor (que ainda não se tornou o líder previsto nos outros filmes da série, mas é visto por alguns como "um falso profeta" e por outros como um salvador) e uma tropa de soldados da Resistência chegam a uma base da Skynet para obter informações (o que, exatamente, não se sabe) e o pau come: após sua unidade cumprir a missão (descobrindo, de quebra, que há vários humanos aprisionados na base, além do desenvolvimento do projeto do T-800), Connor sobe para verificar por que os colegas que ficaram na superfície não estão respondendo e descobre que estes foram emboscados e massacrados por uma daquelas naves gigantescas da Skynet vistas nos "flashbacks para o futuro" dos filmes anteriores. Connor tenta perseguir a nave num helicóptero, uma explosão imensa se sucede e o helicóptero do herói, para usar uma expressão de South Park, imita a carreira de David Caruso no cinema, caindo numa cena espetacularmente filmada.


Após escapar da queda do helicóptero e de um mano-a-mano com um exterminador partido ao meio, mas ainda assim extremamente anti-social (que é resolvida num mano-a-metralhadora, com óbvia vitória de Connor, o portador da metralhadora), Connor vai à base da resistência chefiada por seu superior, General Ashdown (Michael Ironside, badass!), onde descobre o motivo de toda a operação: a Resistência descobriu um sinal eletrônico que consegue paralisar o funcionamento das máquinas, dando aos humanos a carta na manga que precisavam para vencer a guerra. Tal sinal, explica Ashdown, estava na base de dados invadida pelos soldados.

Enquanto isso, no local da operação, um sobrevivente emerge do subterrâneo, coberto de lama e puto da vida: Marcus Wright, o extremo oposto do Drácula de Leslie Nielsen - ele está inexplicavelmente vivo e nem um pouco feliz.

Enquanto Connor vai testar a nova arma, Marcus vaga sem rumo, tentando descobrir que porra aconteceu com o mundo e como ele foi parar na peculiar posição de condenado à morte que cumpriu a pena e continuou vivo. Chegando a uma Los Angeles deserta e em ruínas, o atormentado mancebo se depara com um vulto. Ao chamá-lo, pensando se tratar de um humano, Wright descobre, da maneira mais desaconchegante possível (qual seja, escapando de uma saraivada de balaços de grosso calibre), que se trata de um T-600 , sendo salvo da situação desagradável graças à engenhosa mente de um pirralho que acaba dando cabo do exterminador: o adolescente Kyle Reese, interpretado por Anton Yelchin, que, no primeiro filme da série, acabará sendo enviado ao passado por Connor e se tornando pai deste.

Aqui, temos mais um ponto em favor do filme: minha primeira reação ao ver Yelchin interpretando o personagem foi "Puta merda, ele parece demais com o Michael Biehn!" Quer dizer, não parece muito, mas as expressões, o timbre de voz e os maneirismos do ator tornam bastante crível que, dez anos mais tarde, ele se tornará o personagem interpretado por Biehn no primeiro filme - sua primeira frase ("Come with me if you want to live", a mesma de Reese no primeiro Terminator) é interpretada com perfeição e provoca exatamente a sensação que, acredito, o diretor visava - imediata identificação do personagem.

Por outro lado, temos também aqui um ponto negativo: a quase inútil coleguinha muda de Reese, Star, uma pirralha de (acho) cinco ou seis anos que não faz muita coisa ma história e nos deixa com a nítida sensação de que colocaram a personagem no filme só para agradar ao "público infanto-juvenil". Ou aos adultos babões que não podem ver uma criança que se derretem. Eu gosto de crianças, não tenho nada contra crianças em filmes (desde que em um contexto que faça sentido), mas essas baboseiras sempre me irritam. Não é nada demais, não prejudica muito o filme, mas me enche o saco. Pra que colocar um personagem infantil "fofinho" onde não tem cabimento? Aposto que o roteirista que concebeu a personagem, se indagado, regurgitaria alguma embromação sobre como seu propósito é mostrar a verdadeira dimensão humana do horror que foi o holocausto nuclear, reduzindo até mesmo crianças a um estado animalesco, onde só a sobrevivência importa, mas tal roteirista que vá fazer amor com sua genitora. Fora o fato de não falar, Star é uma criança bonitinha, aparentemente bastante sadia (nem a pau ela estaria desse jeito num mundo pós-nuclear e se alimentando de "coiote de dois dias") e psicologicamente sã. Talvez um pouco tímida, mas nada fora do normal para uma criança de sua idade. É óbvio que a verdadeira intenção de quem criou a personagem foi que todo mundo no cinema exclamasse "Aahhh... que tosinha más fofa!" quando ela entrasse em cena e que todo espectador com idade de um dígito se identificasse com ela. Quanto ao primeiro grupo, o efeito, comigo pelo menos, não funcionou. Não sei quanto ao segundo, mas eu já pertenci a ele e, na minha época, também não funcionava. Vão pra porra.

Através de Reese, Marcus toma conhecimento do que aconteceu com o mundo, da Skynet, da Resistência e de John Connor, que volta e meia transmite mensagens de rádio para dar apoio moral aos membros da Resistência. Aqui, à semelhança do Alien de Ridley Scott, o roteiro não entra em detalhes, mas sugere várias possibilidades interessantes sobre o mundo pós-apocalíptico em que se passa a história. Fica implícito, por exemplo, que a Resistência não é uma força militar bem coordenada, mas, basicamente, uma organização descentralizada de células de guerrilheiros que operam de forma mais ou menos autônoma, colaborando para a consecução do mesmo objetivo - ao contrário das máquinas, que seguem rigidamente um comando central (a Skynet). Isso fica óbvio quando Reese afirma, sem nenhuma ironia, que ele e Star são a "unidade da Resistência em Los Angeles" e nos discursos de Connor pelo rádio (que sempre mencionam algo na linha de "se está ouvindo isso, você é parte da Resistência"). Trata-se de um universo bastante plausível - lembra, por exemplo, as táticas usadas pelos comunistas (com sucesso) em Cuba, no Vietnã e (sem nenhum sucesso, o que eu não lamento) na América do Sul. Em ambos os casos, um confronto tradicional resultaria, sem sombra de dúvida, no massacre do lado mais fraco (os humanos, no caso do filme), de modo que a tática utilizada por este, embora pareça um improviso caótico, é, em última análise, a mais eficiente possível, dadas as circunstâncias. E, como dito, o roteiro não entra em detalhes - como o funcionamento do comércio intergaláctico e a interação com habitantes de outros planetas em Alien, todos esses aspectos sobre a organização da Resistência ficam nas entrelinhas. É aqui, contudo, que qualquer vestígio de sofisticação ou profundidade do roteiro acaba.

Marcus decide colocar um carro para funcionar e cair fora de Los Angeles, que apresenta condições de sobrevivência pouco animadoras. Reese quer ir para o Leste; Marcus para o Norte, para "encontrar alguém" (obviamente, a Dra. Kogan, que poderia explicar que diabos aconteceu com ele), idéia fortemente contrariada por seu novo amiguinho - um dos centros de controle da Skynet fica ao norte, em São Francisco. Em meio ao bate-boca, temos uma cena que consegue ser, simultaneamente, excelente e completamente retardada: quando Marcus finalmente consegue ligar o carro, o cd player, toca-fitas ou seja lá qual for o aparelho de som deste liga automaticamente e começa a tocar Rooster, do Alice in Chains. Wright fica em silêncio, ouvindo a música por alguns instantes. "O que é isso?", indaga Reese; "Algo que meu irmão costumava ouvir", responde Marcus, antes de desligar a música. O excelente? A música combina perfeitamente com a situação de Wright e seu tom melancólico, associado à expressão de pesar do personagem ao lembrar do irmão (o qual, mais uma fez, consegue evocar remorso e culpa com poucas palavras e sem parecer um mané emo), torna a cena genuinamente tocante, sem ser melosa ou forçada - lembre-se que o crime que levou Marcus ao corredor da morte provocou a morte de seu irmão. A idiotice? "O que é isso?" Tudo bem que Kyle é um adolescente, cresceu num mundo devastado pela guerra, mas... puta que o pariu, aí também, como diria o Shakespeare cearense, Falcão, não tem cu que aguente. O moleque não sabe o que é música? Nunca topou com um cd player que funcionava antes? Ninguém jamais cantou uma música pra ele? Nem quando ele era criança? Parece aquelas propagandas ecológicas ridículas que mostram algo como uma criança no futuro, visitando um museu e vendo uma árvore pela primeira vez. "O que é aquilo, vovô?". "É uma árvore, meu filho. Antes, o mundo era cheio delas, até que o homem, em sua infinita insensatez, permitiu que a poluição acabasse com todas." É o tipo de diálogo que não ficaria deslocado numa pérola trash como o The New Barbarians de Castellari ("Eles acreditam em algo chamado... Deus!"). Com a diferença que Fred Williamson consegue fazer até uma abobrinha dessa categoria ficar cool.

O debate dos personagens sobre o roteiro de viagem se encerra abruptamente com a chegada de um "não-sei-o-que Terminator" (confesso que não lembro exatamente da nomenclatura do modelo, mas é basicamente uma nave em miniatura), que leva nossos heróis a bravamente baterem em retirada e a mais uma cena de perseguição que termina quando Marcus, mostrando ser um homem que não gosta de ficar de frescura, derruba a máquina com o lançamento de uma chave-de-roda. Felizmente, a Skynet, como Hollywood e as novelas da Globo, abraça a diversidade, empregando tanto centenas de máquinas praticamente indestrutíveis do porte do Arnoldão quanto alguns poucos discos voadores nanicos e de inteligência artifical questionável, que não conseguem evitar colisão com um "projétil" facilmente contornável por qualquer passarinho ou até mesmo urubu, por mais bem-alimentado que estivesse.

Marcus, Kyle e Star acabam topando com um refúgio de humanos (que nos leva a outro momento de reflexão: esse pessoal não está saudável demais para quem sobreviveu a um "holocausto nuclear"?) que, por sua vez, é atacado por uma máquina gigante totalmente fodástica, resultando em um tremendo pandemônio e em mais uma cena de ação empolgante, envolvendo a tentativa (fracassada) dos heróis de explodir o colosso com um caminhão de combustível; uma fuga de exterminadores-motocicletas (não, não é assim que eles são chamados no filme, mas eu não vou ficar memorizando bobagens como a "classificação" de cada tipo de Terminator e vocês não podem me obrigar) que saem do monstrolão, a bordo de um guindaste; a queda de personagens de uma ponte, a captura de Kyle e Star pelo Terminator gigante, que se converte ou entra (até agora não sei direito) em em uma daquelas naves gigantescas (mais uma vez, não vou ficar decorando o nome dessas porras: elas voam, são grandes pra cacete e soltam bombas - vocês sabem do que estou falando); a intervenção de Connor e a força aérea da Resistência, que não ajuda muito a situação; e, finalmente, a queda de Marcus num rio, redefinindo a expressão "cair de mau jeito".

Finda a diversão, Marcus sai do rio e acaba encontrando Blair Williams, interpretada por Moon Bloodgood (se esse não for um nome artístico, aposto um olho que os pais da moça eram um casal de hippies que conceberam o nome após uma vigorosa sessão de consumo de cogumelos de legalidade controvertida), uma delícia anglo-coreana que devia ser garota-propaganda das virtuosas repercussões sociais da miscigenação. Lamentavelmente, o escroto mentiroso do McG, apesar de toda sua conversa mole sobre como o filme seria R-rated e Moon mostraria dois de seus fantásticos talentos, acabou cedendo, o filme levou a classificação PG-13 e a moça passa o filme todo vestida. Felizmente, a roupa é bastante justa, o que já é algum consolo - Bryce Dallas Howard, por outro lado, passa o filme inteiro usando o tipo de roupa que certos círculos da haute couture batizaram de tit curtains, me levando a ponderar se a moça estava grávida durante as filmagens ou coisa parecida. E há sempre a possibilidade de sair um director's cut com Moon Bloodgood (e talvez até Bryce, porque, como diria Paulo Coelho, sonhar é preciso) mostrando o que realmente mantém o moral da Resistência em alta.

A beldade faz parte da resistência e escapou da queda de um dos caças utilizado por Connor e sua turma para barbarizar as máquinas. Após ajudá-la a se desenroscar do pára-quedas, Marcus resolve seguir com a moça atrás de Connor - apesar de Blair afirmar que o pessoal que foi levado pelas máquinas pode ser praticamente dado como morto, o rapaz acredita que o aspirante a líder da Resistência pode ajudá-lo a resgatar Kyle e a pirralha.

Os dois seguem viagem, são atacados por um bando de maloqueiros que tentam estuprar a moça (sendo frustrados em seu propósito por uma violenta e admirável surra aplicada por Marcus) e...

Bom... para quem não viu o filme ainda, vem spoilers por aí. Muitos. Avisei.

A base da Resistência onde Connor e sua turma estão entocados é protegida por um campo de "minas magnéticas" (que, em tese, só explodiriam caso a área fosse invadida por máquinas). Wright, contudo, acaba atraindo uma delas e provocando sua explosão, conduzindo à reviravolta do filme:

Pois é. Marcus é uma máquina. Um cyborg, tecnicamente, já que ele combina órgãos humanos (como um coração turbinado) com componentes mecânicos, além de um "córtex híbrido", parte humano, parte "chip interface", segundo a descrição de Kate Connor (Bryce). Resumindo: o infeliz é um robô que não sabe que é robô. Não obstante as alegações de incompreensão do rapaz, a recepção de Connor não é das mais calorosas, conforme se pode inferir da foto acima: Marcus é acorrentado e acusado pelo herói de ter sido enviado para matá-lo.

Não sei do público em geral, mas eu não achei essa revelação tão surpreendente assim. Afinal, o filme começa com o personagem concordando em doar seu corpo para a empresa que vai acabar criando a Skynet e sendo executado. Quinze anos depois, quando as máquinas estão em guerra com a humanidade, o rapaz ressuscita inexplicavelmente (saindo de uma base da Skynet, diga-se de passagem) e passa cerca de quarenta minutos aguentando baculejos que deixariam qualquer ser humano normal em pedaços (o mais inacreditável é a queda de Wright no rio). Além de tudo isso, há a cena em que ele cobre de porrada os orebas que tentavam estuprar Blair: em um momento que faz parece que McG estava morrendo de rir atrás da câmera, pensando "hihihihihihi... O pessoal nem vai se ligar!", Wright leva um soco na cara que derrubaria qualquer um e reage apenas virando o rosto para o lado e, em seguida, voltando-se novamente para o agressor, sem esboçar qualquer incômodo, e tratando de cobrí-lo de pancadas. A cena é idêntica a várias similares vividas pelo exterminador interpretado pelo Governator nos três primeiros filmes e, para mim, deixa bem óbvio o que a Cyberdine tinha feito com o cadáver de Marcus.

Ainda assim, o momento de "revelação" é muito bem executado. Tanto Bale quanto Worthington estão excelentes, interpretando com intensidade plausível a reação dos personagens à situação: o primeiro deixando evidente o ódio que sente pelas máquinas e a indignação com a criatura que julga ter sido enviada para matá-lo e com a Skynet em geral; o segundo, demonstrando, primeiro, incredulidade; depois, desespero diante de sua atual condição; e, por fim, revolta com a acusação. O confronto chega a um impasse quando Marcus, ao ser acusado de ter "matado meu pai, Kyle Reese", afirma que, se quisesse, o teria feito há dois dias, em LA, e aduz que Reese está sendo levado para uma base da Skynet.

Enquanto Connor entra em conflito, remoendo-se de dúvidas sobre a possibilidade de Marcus estar falando a verdade ("Eu olhei nos olhos daquela coisa e ela acredita em tudo que está dizendo", afirma ele a sua esposa, enquanto eu me pergunto se teria sido este o momento em que o diretor de fotografia resolveu, imprudentemente, ficar mexendo na iluminação, ensejando o célebre e hilariante faniquito de Bale no set). Blair, por seu turno, convencida de que Marcus é um cara legal (fazendo-me repreender mentalmente o personagem por não ter aproveitado seu momento "heróico" para dar uns pegas na agradecida beldade), decide sacanear e libertar o prisioneiro.

Mais uma cena de ação repleta de balaços e explosões é desencadeada. O conflito se encerra com Wright e Connor chegando a um trégua relutante: o primeiro, a fim de descobrir e se vingar de quem o transformou no que é (não sei vocês, mas se eu acordasse de manhã e descobrisse que ganhei superforça e fiquei praticamente invulnerável, a última coisa que ocuparia minha mente seria desejo de vingança contra quem fez essa "maldade" comigo; por outro lado, eu, ao contrário do personagem, não provoquei a morte de meu irmão nem estou ansioso para ser punido por meus pecados, de modo que minha perspectiva talvez não seja a mais adequada para julgá-lo), se compromete a chegar à base da Skynet em San Francisco e viabilizar a entrada do segundo no local, para que este possa resgatar Kyle. É lá onde ocorrerá o clímax do filme, com mais uma fodástica sequência de ação que inclui a revelação do verdadeiro "plano da Skynet" (a suprema imbecilidade do roteiro, que tratarei mais adiante), uma participação especial do T-800, encarnado por um dublê com rosto CGI do Schwarzenneger, um quebra-pau entre este, Connor e Marcus e o trágico final de Marcus, que resolve se sacrificar para salvar o futuro líder da Resistência e, assim, encontra a redenção.

Bom, parafraseando a Tiazinha, "a vida é muito difícil porque tem muitas dificuldades", mas vamos lá. Em primeiro lugar, as sequências de ação do filme são, para minha incredulidade, realmente espetaculares e extremamente bem dirigidas. A primeira coisa que pensei quando soube que o tal McG dirigiria o filme foi "lá vem merda". Bom, na verdade, a primeira coisa que pensei foi o que sempre penso quando escuto ou leio o "nome de guerra" do diretor: "Que porra de nome retardado é esse? Quem esse imbecil pensa que é? Cantor de hip-hop? Você é um adulto, sua besta quadrada! Deixe de ser mané e se chame de Joseph McGinty, como seus pais queriam. Pare de se portar como um adolescente debilóide que se acha o máximo porque inventou um apelido ridículo e quer que todo mundo passe a usá-lo. Ou como um apresentador brasileiro xarope, mas inexplicavelmente popular, que insiste em ser chamado de 'Faustão' só porque não consegue se livrar da obesidade. Por que você não morre? MORRA, PORRA, MORRA! AHHHHHHHHHHH" Mas a segunda coisa que pensei foi "lá vem merda". É comum colocarem o McG na mesma categoria de gente como Brett Ratner, Francis Lawrence ou Marcus Nispel: aquele tipo de diretor bovino, submisso e sem personalidade que os estúdios chamam quando querem alguém para dirigir, sem dar trabalho nem manifestar "frescura de artista", um blockbuster concebido por comitê para vender brinquedos e atrair adolescentes ou render dinheiro fácil em cima da popularidade do astro ou de personagens já famosos (e.g., X-Men 3, Dragão Vermelho, Eu Sou a Lenda e as "reimaginações" de Sexta-Feira 13 e O Massacre da Serra Elétrica).

Eu não sou uma dessas pessoas. Sempre achei que McG era um diretor muito pior do que os outros mencionados e ainda mais cínico e picareta. Independentemente dos defeitos dos demais (tais como falta de qualquer nota autoral em seus trabalhos, preponderância de estilo sobre substância, submissão fácil a qualquer imposição de executivos que não sabem porra nenhum sobre cinema), é inegável que seus filmes, pelo menos, são dirigidos com um mínimo de profissionalismo. Digo mais: contrariando o que parece ser um consenso, acho o Dragão Vermelho de Ratner excelente e o considero uma adaptação da obra de Thomas Harris quase tão boa quanto o Manhunter de Michael Mann (já achei até superior, mas, depois de rever Manhunter recentemente e fazer uma comparação, mudei de opinião). Já o McG, para mim, sempre foi a epítome de tudo que eu mais detesto em videoclipeiros (sendo superado apenas pela outra abominação de um nome só, Pitof) e, até ver este filme, eu achava até generosidade chamá-lo de "diretor". Era o tipo de sujeito cujos filmes não tem graça nem como diversão trash: em minha opinião, eles são simplesmente desinteressantes, medíocres e só tem apelo para quem nunca teve oportunidade de ver um filme realmente bom. O sucesso de suas duas asneiras inspiradas pelo seriado "As Panteras" sempre foi um enigma para mim: nunca achei que aquelas porcarias funcionassem nem como filme de ação, nem como paródiasde filme de ação, nem como paródia da série de TV, e suas únicas virtudes são as protagonistas gostosas - e se eu quiser ver filme só por causa de mulher gostosa, vou ver um pornô dos anos 70, onde pelo menos elas tiram a roupa. É o tipo de injustiça que sempre me emputeceu: caras como William Friedkin, John Milius e Michael Cimino estão praticamente no limbo hollywoodiano (apesar de Milius ter escrito para a HBO o que considero a melhor série de TV de todos os tempos, Roma), Enzo Castellari, Michele Soavi e Sergio Martino estão virtualmente aposentados ou dirigindo bobagens para a TV italiana e um jacu como o McG continua dirigindo filmes com orçamentos milionários.

Por tudo isso, fiquei estarrecido com a competência do indivíduo na direção do filme. Todas as vezes que descrevi alguma cena de ação de Terminator: Salvation como "espetacular", "fodástica" ou análogos, o fiz sem nenhuma ironia: o homem demonstra uma habilidade inédita na condução das cenas de ação, que são todas (por mais implausíveis) completamente convincentes, despidas de qualquer dos tiques de videoclipeiro que infestam o cinema de ação atual e provocam uma imersão completa do espectador. Nada de câmera tremendo, dez cortes por segundo ou floreios estilísticos retardados e sem propósito que impedem o espectador de entender o que está se passando (a título de exemplo, veja Quantum of Solace). A fuga de Reese, Marcus e Star no reboque, por exemplo, me fez lembrar cenas de perseguição prolongadas e espetaculares de filmes como Operação França e Viver e Morrer em LA, de Friedkin, Os Implacáveis, de Peckinpah e La Polizia Incrimina, La Legge Assolve de Castellari. Não me entendam mal: não estou comparando T4 a nenhum desses filmes. As cenas de ação, entretanto, têm o mesmo espírito: embora auxiliadas por uma caralhada de efeitos digitais, nenhuma das sequências pauleira de Terminator: Salvation vai deixar você pensando coisas como "porra, é óbvio que isso foi um efeito especial" , "peraí, que aconteceu aqui mesmo?", "cara, esse negócio já rendeu o que tinha que render" ou "Puta que o pariu, eu não estou conseguindo entender nada!" Lembram, enfim, os bons filmes de ação das décadas de 70 e 80, onde os diretores não achavam necessário ficar sacudindo a câmera ou cortando para outro ângulo a cada dez segundos para deixar manter a atenção do público.

As interpretações, na medida do possível, são igualmente eficientes. Pelo menos as de Bale, Worthington e Yelchin. Como já falei, Anton Yelchin faz uma emulação perfeita do personagem interpretado por Michael Biehn no primeiro filme da série. Os outros dois atores foram, em geral, esculachados pela "crítica profissional de cinema", mas, como Tolstoy já escreveu, "a 'crítica profissional de cinema' pode ir para a morada da genitália masculina".

O problema não são as interpretações, mas ao roteiro que investe pouco em caracterizações. E nem isso considero grande defeito, dentro dos padrões em que se enquadra o filme: trata-se de um blockbuster de ação. A trama e as situações não deixam margem para que os atores façam muito além do necessário. Não se pode dizer, por exemplo, que seja uma "má caracterização" o fato de Connor não sofrer conflitos com a necessidade de enviar o próprio pai ao passado, sabendo que isso vai provocar a morte do genitor - ele só encontra Kyle Reese no final do filme, de modo que não há, propriamente, uma relação entre os dois na história. A crítica de que Bale passa a maior parte do filme falando grosso, gritando e basicamente parecendo puto da vida é vazia: de que outra maneira seu personagem deveria se comportar? Ele está no meio de uma guerra e de um lado que está em imensa desvantagem. Seria meio ridículo que o personagem parasse para ter momentos de ternura ou refletir sobre as complexidades da existência. Alguém, sinceramente, achou que os momentos de "interesse humano" de Neo, Trinity, Morpheus e Link acrescentaram alguma coisa a The Matrix Reloaded, além de minutos de duração? O mesmo se pode dizer do personagem interpretado por Sam Worthington. O ator contribui com o necessário: ele tem uma presença forte, convence como um sujeito que está confuso e amargurado a maior parte do tempo e seu momento de altruísmo no final do filme é totalmente coerente com as motivações do personagem. Mais uma vez, não é nada fantástico, mas atende ao propósito do filme.

Onde, então, está o problema? No roteiro. A trama, quando analisada com mais cuidado, é profundamente imbecil em vários níveis. É inacreditável que tantos roteiristas tenham "polido" o texto e ninguém tenha percebido isso. E cada análise deixa mais um buraco evidente.

Em primeiro lugar, vamos ao "grande plano da Skynet": ressuscitar Marcus Wright como um robô que não sabe que é robô, para que o dito cujo a) encontre Kyle Reese, para que este acabe sendo capturado; b) se infiltre na Resistência e encontre John Connor; c) convença John Connor de que não tem a intenção de matá-lo, que Kyle Reese foi capturado e está correndo risco de vida; e d) invada uma das bases da Skynet, permitindo a entrada de Connor, a pretexto de salvar Kyle, para que este possa ser emboscado e morto.

Tudo isso acontece no filme. O problema é que tudo acontece como fruto do acaso. Como Marcus encontra Kyle? Por acaso. Como ele conhece Blair e acaba descobrindo o esconderijo de Connor? Sorte. Ele convence Connor de toda a história? Sim. Era previsível que isso acontecesse? Nem fodendo. Wright só não vira sucata porque Blair tem um fraco por ele, o que também não era previsível. Querer convencer o espectador de que tudo faz parte de um plano minuciosamente arquitato pelo maligno vilão cibernético é mais ou menos como eu querer convencer alguém de eu determino quando vai chover e quando não vai, apontando como prova o fato de que, toda vez que chove, eu encho a boca para dizer "eu sabia que ia chover".

Em segundo lugar, vamos ao papel de Kyle Reese. Tenho que, preliminarmente, fazer uma observação já feita pelo Felipe Guerra: o filme se passa em 2018; o primeiro Exterminador (bem como Reese) foram enviados ao passado em 2029. Sendo assim, como caralho a Skynet sabe que Reese vai se tornar pai de Connor? Ela é onisciente? Consegue ver o passado e o futuro? É a única explicação. Caso contrário, por que Connor arriscaria a vida para salvá-lo?

Tudo bem, esqueçamos esse detalhe por um instante e abordemos outra idiotice: já que a Skynet sabe que Reese é o futuro pai de John Connor, por que, ao capturá-lo, não o mata logo? Pela lógica, isso não impediria o nascimento de Connor, tornando desnecessária toda a emboscada, já que a existência do personagem seria simplesmente anulada? Suscitei esse ponto ao falar sobre o filme com o Just Daniel, que rebateu com os seguintes argumentos: "Cara, mas eu acho que isso tem até uma explicação coerente e simples: Quem garante que John Connor não vai nascer apenas pq Kyle Reese não será o pai da criança? Uma das coisas que o Cameron criou até meio q sem querer foi as "intervenções temporais" que ocorre na série. O destino da história é mudado conforme quem é mandado ao passado (Ou no caso desse filme, no futuro) E acho isso uma das coisas mais fascinantes do filme! Se vc pensar bem, por mais louco que seja para o cérebro assimilar, todos os filmes depois do primeiro, podem ser considerados uma espécie de "prequel" para o primeiro filme! Vamos finalmente descobrir como foi o relacionamento entre John e Reese, contado no primeiro filme! Outra coisa bizarra que vc precisa pensar sobre o esquema-Reese-Connor: O primeiro terminator mandado para o passado em 84 foi mandado para matar o JÁ existente John Connor, independente da resistância humana ter mandado o Reese ou não. Ou seja, Connor já existia. Aconteceu a "intervensão do tempo" com Reese sendo o pai, mas ele teria nascido de qualquer forma." A explicação faz sentido, mas tenho um contra-argumento bem mais singelo: "Seguro morreu de velho." A Skynet podia muito bem matar logo Reese, só por precaução, sem que Connor tomasse conhecimento disso (e como ele poderia saber se Reese está ou não vivo antes de cair na cilada?). Era ganhar ou ganhar: ou a existência do herói era anulada e o problema estava resolvido, ou ele continuaria existindo por algum outro motivo e cairia na emboscada. Seja como for, um fato é incontestável: não havia qualquer motivo minimamente razoável para manter Kyle Reese vivo. Quanto ao fato de um John Connor já existente ter enviado Kyle Reese para o passado no primeiro filme (significando que, de uma maneira ou outra, ele teria nascido)... bom para falar sobre isso, vou ter que falar sobre a série como um todo, e na verdade foi isso que realmente me fez decidir (após ler o post do JD) a publicar um post sobre o filme, ao invés de simplesmente responder à mensagem.

Tenho que confessar um coisa quase tão bisonha quanto minha afeição por este filme: eu gosto mais do Terminator 3 do que do segundo, mesmo achando o segundo melhor. Deve ser difícil assimilar (na verdade, imagino que quem ler isso vai questionar meu nível de inteligência, não necessariamente com tanta diplomacia), mas minha justificativa é que acho o terceiro mais fiel ao espírito do Teminator original (que considero o melhor da série) que o Judgment Day. O que conduz a uma assertiva das mais contraditórias (pois é, eu sou um homem extremamente complexo): embora, basicamente, eu goste de todos os filmes da série (até mesmo desta bomba), minha opinião é que a melhor continuação para o primeiro Terminator seria nenhuma continuação. O final do primeiro filme, para mim, conclui da história de maneira perfeita e qualquer continuação seria contraditória (como foi o caso do T2) ou desnecessária (como as outras duas). Por que?

Porque, apesar de toda a conversa sobre "não há destino além do que fazemos", a idéia que se pode tirar do primeiro filme é que, naquele universo, o futuro está, sim, escrito, e que qualquer tentativa de mudá-lo é inócua. A Skynet envia um Exterminador para dar cabo de Sarah Connor antes que esta tenha a chance de ter o filho; Connor envie Reese para protegê-la. Dois são os resultados: 1) Sarah, inicialmente uma garçonete cabeça-de-vento, desenvolve a personalidade forte e a obsessão militarista que vai ser crucial para a formação do futuro líder da humanidade; 2) Reese acaba partindo para o oba-oba com Sarah, resultando na concepção de Connor. Em resumo: a tentativa da Skynet em evitar o nascimento de Connor acaba provocando a existência deste. A cena final do filme encerra a história com uma elegância ímpar: "There's a storm coming." "I know." Sarah sabe que o holocausto nuclear está por vir e que este é inevitável; resta-lhe apenas proteger a si mesma e cuidar da criação do filho, garantindo o futuro da humanidade. Fim. E o filme tinha aquele tom fatalista muito comum no cinema sci-fi e policial da década de 70 (que chamei de "clima de shit happens" ao falar sobre The Incredible Melting Man) que sempre me pareceu mais fiel à realidade.

Considero o Terminator 2, devo adiantar, um dos melhores filmes de ação/ficção científica de todos os tempos. O roteiro é excelente, as interpretações são ótimas e os efeitos especiais, pioneiros à época, ainda hoje impressionam. A relação entre o John Connor adolescente e o exterminador "bonzinho" do Arnoldão (que poderia ser um troço pra lá de piegas) é totalmente envolvente, equilibrando drama e humor com maestria e sendo, ao final, geuinamente comovente, até para um puto insensível como eu; Sarah Connor é uma das heroínas mais fodonas do cinema (aquela, ao contrário das "panteras" do McG, me convence de que consegue arrombar um macho na porrada); o vilão é igualmente badass e não deixa o espectador incrédulo quando está batendo a poeira do Schwarzenegger; e as cenas de ação, como era típico nos filmes de Cameron, são todas fantásticas. Como o primeiro filme da série, é um espécime raríssimo hoje em dia - o blockbuster de ação inteligente, mesclando cenas de ação espetaculares e boas caracterizações sem jamais perder o ritmo ou insultar a inteligência do espectador.

Mas... entre um e outro filme, Cameron envelheceu. E a tendência da maioria das pessoas (gente como eu e o augusto Renzo Mora sendo óbvias exceções), à medida em que envelhece, é amolecer, especialmente quando são bem sucedidas. Mesmo quando a pessoa em questão é um notório control freak e escroto sádico, porém extremamente talentoso, como o Cameron. Não se pode dizer que T2 seja um filme para pessoas com sensibilidades delicadas, mas é inegável que é um filme feito por alguém mais sensível do que quem dirigiu The Terminator. Via de conseqüência, a atmosfera pessimista (embora extremamente coerente) do primeiro filme é substituída por uma visão mais Disney (repito: em comparação ao primeiro filme), com um final feliz incluindo até narração que pode ser sintetizada como "ainda há esperança para a humanidade". Então, eu admito que o filme é excelente, mas esse "estado de espírito" completamente antagônico ao antecessor sempre me incomodou e me deixou com a sensação de que o sentimentalismo falou mais alto do que a consistência para o "King of the World". Não é nada demais, não é coisa tão braba quanto o melô de Titanic, pode até ser considerado frescura minha, mas me incomoda. E convenhamos, a história é, essencialmente, um repeteco do primeiro filme, mas anabolizada, com efeitos especiais muito melhores e um tom mais light. De qualquer maneira, com aquele final, a história estava, definitivamente encerrada.

O que nos leva ao terceiro filme. E, antes de mais nada, essa história de que Mostow é um picareta capacho de executivo e que o filme foi idéia de um bando de idiotas que só queriam ganhar dinheiro fácil é bobagem. O filme seria feito de qualquer jeito e, se não fosse o sucesso de Titanic (e a subseqüente desnecessidade de trabalhar), Cameron seria o diretor. O roteiro talvez até tivesse algumas babaquices a menos, mas a história, creio eu, não seria muito diferente. Quando se tem em vista que o roteiro foi escrito por Michael Ferris e John Brancato (autores de preciosidades como Catwoman e The Net), a qualidade do texto se torna até surpreendente. A mesma generosidade não se conceder ao T4, que, apesar de inicialmente escrito pela dupla dinâmica supracitada, foi recauchutado por uma porrada de roteiristas, inclusive o celebrado Paul Haggis e Jonathan Nolan, co-autor de The Dark Knight, e continuou sendo podre. Mas, enfim, como eu disse ao falar to T1, qualquer sequência seria contraditória ou redundante. E neste último caso que se enquadra o T3. Gosto mais deste do que do segundo porque ele é bem menos sentimental, tem mais a ver com o espírito do primeiro (eu gosto especialmente da maneira como John Connor é retratado no início do filme - agora que o futuro e seu destino heróico foram, presume-se, anulados, o personagem se torna basicamente um mané fracassado), o Exterminador bonzinho não é tão bonzinho assim (só programado para não fazer mal a certos humanos; eu sempre dou uma risada com o desinteressado "I killed you" do personagem) e o final espírito-de-porco me lembra exatamente aquela atmosfera de shit happens que o primeiro filme capturou tão bem. E Kristanna Loken é gostosa pra caramba. Não é uma vilã do calibre do T-1000, mas gostei do estilo "Barbie Assassina" da T-X e nunca achei a interpretação da moça ruim como parece ser a opinião geral. Certo, ela não é tão fodona quanto o T-1000, mas convence. Além do mais, é bem mais plausível ela se aproximar de mim e arrancar meu cérebro de surpresa do que um Robert Patrick mal-encarado. As cenas de ação do filme são excelentes, máxime quando comparadas com o "padrão" dos filmes de ação da época - em 2003, a mania chata de filmar toda cena de ação imitando a série Matrix ainda estava em alta. E o já referido final nem um pouco feliz, em minha opinião, retoma a idéia do original - de que o futuro já está escrito e que qualquer tentativa de alterá-lo será inócua. O argumento de que "não é possível mudar o futuro, no máximo adiá-lo" não é tão elegante quanto a inevitabilidade retratada no primeiro (nem poderia, pois o Cameron tornou isso impossível com o T2), mas acho bem menos irritante do que "não há futuro além do que fazemos" - que, convenhamos, já era um clichê muito manjado mesmo à época do original. Claro que o filme tem vários defeitos: o principal deles é que John Connor, apesar de toda a criação espartana que, presume-se, teve da mãe até esta ser internada, se torna um tremendo oreba, que leva uma rasteira até de Claire Danes e começa a choramingar diante do menor sinal de perigo. Por outro lado, pode-se argumentar que o fim da idéia de que o seu destino seria se tornar o grande líder da humanidade fez o personagem perder toda a motivação para se tornar alguma coisa que preste.

Embora alguns critiquem o fato de o filme torna nulo tudo que aconteceu no segundo (e torna mesmo), há de se levar em consideração de que, se o T2 tivesse tanta consistência assim, John Connor teria deixado de existir no final do filme. Vejamos: Connor do futuro manda Kyle Reese para proteger sua mãe do Terminator no passado, Kyle engravida Sarah e Connor nasce. No segundo filme, a Skynet manda mais um exterminador; Connor manda outro, "reprogramado" para protegê-lo; no final do filme, os Connor e cia. impedem a existência da Skynet. Para o filme ser inteiramente lógico, no momento em que a criação da Skynet foi impedida, Connor, o T-800 e o T-1000 se desintegrariam. Afinal, sem Skynet, não haveria exterminadores, não haveria envio do T-800 para matar Sarah Connor, não haveria bem-bom entre esta e Kyle Reese e, por conseguinte, não haveria concepção de John Connor.

Mas como não, se Kyle Reese foi enviado pelo passado por um John Connor já existente, como sugeriu o JD? Porque passado, presente e futuro já estão preordenados. Eu poderia citar Stephen Hawking e parecer inteligente e culto pra caramba, mas não vou mentir: não tomei conhecimento da idéia de que o tempo é simultâneo, sendo apenas a percepção humana limitada que nos leva a vê-lo de forma linear, lendo Física Quântica ou Cosmologia. Foi lendo Watchmen. Não sei se essa teoria corresponde à realidade ou não (embora a idéia explique várias coisas que parecem não fazer sentido, de forma bem mais lógica do que crença no sobrenatural), mas acredito que o universo do primeiro filme se encaixa perfeitamente nela. Assim, embora certas pessoas, cuja opinião respeito bastante, reclamem que o filme torna sem propósito tudo que ocorreu no segundo filme, pode-se dizer que tudo que ocorre no segundo filme após a explosão da Cyberdine torna o próprio segundo filme nulo. Logo, o terceiro filme não me incomoda por isso, nem o quarto.

Toda essa embromação, contudo, torna um fato inequívoco: conforme escrevi reiteradas vezes, o roteiro de Terminator Salvation é, essencialmente, uma bosta. Não há um motivo razoável para as máquinas manterem Kyle Reese vivo. A Skynet, no universo do quarto filme, é basicamente um Dr. Evil digital.

Vamos a outras falhas: reparem que, na minha "síntese" da história, pouco mencionei a personagem de Kate Connor. Isso é porque a única função de Bryce Dallas Howard é embelezar o cenário - a personagem não faz praticamente nada e, ao contrário de sua colega Moon Bloodgood, nem usa roupa que valorize seus talentos infradramáticos. Fora Connor, Marcus, Reese, e Blair, os "personagens" são tão despidos de personalidade que é difícil lembrar seus nomes (mesmo o Ashdown de Michael Ironside só causa alguma impressão porque é interpretado por Michael Ironside, que é totalmente foda. Star só é memorável porque é a única criança da história). Nunca fica claro por que a Skynet está levando uma reca de gente para São Francisco (só para acobertar o fato de que o verdadeiro objetivo era capturar Kyle? Não engulo. O encontro deste com o monstrolão também foi inteiramente casual. E também havia um monte de humanos aprisionados naquela base no início do filme.) A insinuação de que tudo que Marcus viu em sua incrível jornada estava sendo "filmado" pela Skynet é igualmente sem nexo: não seria mais fácil, então, a Skynet simplesmente ter invadido o "underground lair" de Connor e dar cabo do rapaz? Ou ter capturado Kyle quando eles estavam em LA, sem todo aquele trabalho? Aliás, como caralho Kyle sabe dirigir um carro? A cena em que Marcus consegue botar um veículo para pegar deixa implícito que o moleque provavelmente nunca tinha sido passageiro em um veículo automotor, quanto mais motorista.

E temos, claro, o Arnoldão CGI que, posso presumir, todo mundo acha absolutamente badass. E é. Mas, como já observado por terceiros, no primeiro filme da série, Reese e o Exterminador são enviados à década de 1980 em 2029; Terminator Salvation se passa em 2018. Quer dizer que a Skynet passou onze anos utilizando o mesmo T-800 que vemos em aqui? Porra, em cerca de quatro anos, o mané do Steve Jobs conseguiu lançar uns quatro modelos diferentes de iPhone (todos igualmente fuleiros); não vamos nem contar quantas versões de iPod o cidadão e sua empresa conseguiram inventar. A super-hiper-ultra-foderosa vilã digital Skynet, por seu turno, só consegue produzir um modelo mais moderno de Terminator depois de mais de dez anos? E, assim que consegue, sai com um modelo mais espetacular que o outro? E as conversas de Reese no primeiro filme sobre como precisava esperar o Exterminador atacar Sarah para identificá-lo? Como isso se conforma com a sugestão, contida no Salvation, de que todos os T-800 são idênticos ao Schwarzenegger? E a história, no primeiro filme, sobre os T-600 terem uma pele de borracha, claramente de fajuta, que tornava fácil identificá-los, quando os T-600 que vemos aqui nunca tem qualquer arremedo de pele?

Mais bobagens? Se toda a jornada de Marcus foi um plano minuciosamente arquitetado pela Skynet (e isso é tão plausível quanto a teoria de que o ataque de 11 de setembro ao WTC foi uma conspiração tramada pelo governo americano ou que o Red Bull é um estimulante desenvolvido pela CIA durante a guerra do Vietnã para "bombar" os soldados), por que porra todas as máquinas que ele encontra até seu "segredo" ser descoberto por Connor tratam o rapaz com a mesma cortesia que o T-600 na foto acima? Por que esse comportamento muda assim que ele descobre o que é e decide invadir a base da Skynet? E pra que porra Helena Bonham-Carter queria tanto, especificamente, o corpo dele, no início do filme? Não servia outro defunto?

Posso passar mais várias páginas falando sobre outros detalhes estapafúrdios do roteiro, mas nada disso responde às questões que me atormentam: por que, mesmo compreendendo plenamente que o roteiro deste filme é uma afronta a qualquer pessoa com um semblante de inteligência, eu adoro esta porcaria? Por que já vi quatro vezes (invariavelmente com exclamações do tipo "essa cena foi totalmente do caralho" e, em seguida, resmungando, para o tédio de minha esposa e de qualquer pessoa que esteja por perto, coisas como "bicho, isso é muito idiota" ou "esse 'plano' é tão retardado que não dá nem pra falar" e provocando questionamentos válidos como "então por que raios você está vendo esse filme de novo?")? Por que já estou prestes a abrir a carteira assim que o DVD sair? E voltar a abrí-la quando o Director's Cut sair? E por que nada disso decorre do fator trash do filme (que, convenhamos, é inexistente em face de preciosidades como The Incredible Shrinking Man ou Blackenstein)?

Eu posso especular. Talvez seja porque, em uma época de filmes de ação com heróis sensíveis, politicamente corretos (porra, até o James Bond deixou de tratar as mulheres como objetos na época do Pierce Brosnan, até Daniel Craig mostrar como um 007 de verdade se comporta) e metrossexuais (veja, por exemplo, Tom Cruise e Jonathan Rhys-Meyers em Missão Impossível III), em que as gatinhas chamadas de Jonas Brothers levam menininhas à loucura e e em que é socialmente admissível (e até encorajado) um homem heterossexual passar horas num salão de beleza ou escolhendo sapatos e condicionadores, seja um alento ver um filme onde os homens são homens e as mulheres são gostosas. Onde os heróis são uma dupla de brucutus mal lavados que passam o filme inteiro com a cara amarrada ou gritando e dando tiros e porradas (isso talvez também explique o fato de eu achar Jason Statham totalmente foda). Talvez seja porque, numa época de filmes de ação cujos cineastas acham que a náusea provocada por uma câmera trêmula e a impossibilidade de entender o que está se passando guardam relação de sinonímia com "empolgação do espectador", seja um alívio finalmente ver um blockbuster de ação onde as cenas de ação são de espectaculares e bem dirigidas, podendo ser acompanhadas do começo ao fim sem um momento de tédio, confusão ou vontade de encontrar o diretor e espancá-lo até a morte com um instrumento contundente. A última hipótese se torna ainda mais convincente quando eu lembro que, pouco antes de ver Terminator Salvation, vi seu extremo oposto, Quantum of Solace - uma obra com roteiro decente que poderia ser um filme muito bom, se não tivesse um diretor "sofisticado" que não entende merda nenhuma de cenas de ação e acha que tremer a câmera e inserir cortes aleatórios e "simbolismo" sem propósito vão mostrar toda a sua inteligência e habilidade. Ou talvez seja, simplesmente, porque eu gosto de filmes com explosões, robôs, Christian Bale quebrando o pau e chamando um T-800 de "filho da puta", Michael Ironside dando esporro nos outros, Moon Bloodgood e Bryce Dallas Howard.

A última possibilidade, admito, é um contradição inaceitável de minha parte. Afinal, eu escrevi mensagens, cuja descrição mais benevolente seria "prolixas", esculachando impiedosamente a paixão do JD pelo Drácula de Coppola e reduzindo a admiração do rapaz pelo filme a, basicamente, "confusão de incoerência com complexidade" e "se deixar levar por excesso de estilo sobre ausência completa de substância". Isso faz de mim um hipócrita? Provavelmente.

Em minha defesa, posso apenas afirmar que Bram Stoker's Dracula não tinha explosões, robôs, Schwarzenegger, Christian Bale dando porrada, Michael Ironside, Bryce Dallas Howard ou Moon Bloodgood.

Por outro lado, a supracitada obra, que eu odeio profundamente, tem Sadie Frost e Monica Bellucci seminuas, ao passo que as duas moças do T4 permanecem vestidas durante todo o filme.

Mas talvez não permaneçam no Director's Cut.

3 comentários:

  1. Que coisa estranha... no meu blog tá mostrando que você atualizou há 3 semanas atrás (e de falto, pela data acima do seu post aconteceu isso mesmo), mas esta semana ainda eu entrei várias vezes aqui e ainda era o post do Black Frankenstein que estampava o blog... Só queria comentar isso, por enquanto, hehe, não li o texto ainda, já que acabei de descobrir que você atualizou e preciso de separar um tempo para ler. Assim que o fizer eu retorno.

    ResponderExcluir
  2. Cara, também notei isso e até agora não entendi, pois publiquei o post esta semana (acho que quarta-feira, dia 15). Acho que é porque comecei a editar o texto e salvar como rascunho há mais ou menos umas três semanas, mas, devido a falta de tempo, tive que ir concluindo quando dava, aos poucos.

    ResponderExcluir