Estou chegando à conclusão de que eu era uma criança meio idiota. A primeira vez que vi "O Incrível Homem que Derreteu", quando eu tinha uns oito ou nove anos, achei o filme o "maior legal". Tinha um monstro nojento, um monte de mortes, uma intensa perseguição e efeitos especiais massa. Essa era minha percepção. Deparando-me, hoje, com a oportunidade de rever esta produção, percebo que minha credibilidade como crítico-mírim de cinema era, digamos, questionável. Não me interpretem mal: o filme continua muito divertido, mas por motivos inteiramente diferentes dos que eu percebi quando assisti pela primeira vez. Vejamos por que.
O filme se inicia com uma série de borrões de diversas cores e, em seguida, o brilho das estrelas, indicando, sutilmente, o lançamento e viagem de uma espaçonave, a Scorpio 5. Passam-se os créditos do filme, através dos quais descobrimos que a maquiagem (e, provavelmente, toda a despesas do orçamento da produção) ficou por conta de Rick Baker.
Três astronautas deitados em um tosco set "hi-tech", comunicam que estão adentrando "os anéis de Saturno". Um deles: "Ninguém jamais viu algo assim!" e o filme corta para algo que não sei se é uma maquete vagabunda ou stock footage chibunga de um satélite orbitando em torno de algo que parece ser uma superfície cinzenta. O satélite fuleiro é intercalado com cenas dos astronautas apertando botões (essa tal de tecnologia é um negócio fabuloso) e trocando , com a base, mensagens que definem "função fática da linguagem", até que um deles, titular de um bigode digno de ator pornô dos anos 70, não se contém e exclama: "Magnífico! Você nunca viu nada até ver o sol através dos anéis de Saturno!" A empolgação da assertiva destoa da expressão do rapaz, típica de quem precisa urgentemente satisfazer necessidades fisiológicas. Tamanha hipérbole nos deixa aguardando um visual espetacular, mas , ao invés disso, somos fulminados por um firme chute nos testículos: o "sol visto através dos anéis de Saturno" é só uma bola (aliás, uma esfera pela metade) cor-de-laranja opaca, o que nos leva a crer que o astronauta entusiasmado nunca se dedicou muito ao turismo.
Mais uma série de borrões avermelhados de significado dúbio surgem na tela. Presumimos que os borrões significam a aterrissagem da nave em Saturno. Mais alguns borrões ocupam a tela e,
em seguida, o cosmonauta com excesso de entusiasmo é mostrado fazendo caretas, com um filete de sangue escorrendo pelo nariz. São duas as alternativas: ou a aterrissagem não correu às mil maravilhas (nem poderia, afinal, conforme meus exaustivos estudos de astronomia [isto é, dei uma olhada em "Saturno" na wikipedia] 97% do planeta é gasoso) ou a ânsia do rapaz em satisfazer suas necessidades fisiológicas estão ainda mais prementes. Qualquer das hipóteses é prenúncio de desgraça.
Nada é explicitado, pois o filme corta para um quarto de hospital, onde uma enfermeira bem-alimentada e um médico black power verificam a situação de um paciente mumificado por bandagens. o prontuário do paciente está ilegível, exceto por um "RADIATION" em letras garrafais vermelhas. Como minha resenha de "Drácula vs Frankenstein" já demonstrou, meus poderes de dedução são notáveis, de modo que vou adivinhar o que se passa aqui: 1) o paciente é o astronauta outrora empolgado e intestinalmente comprometido, 2) ocorreu algum imprevisto na aterrissagem que resultou no atual quadro clínico e 3) ele é o único sobrevivente. O médico explica que nada está adiantando, que ele nunca viu nada assim antes e que não entende por que ele (o paciente, não o médico) foi o único sobrevivente. É assim que se escreve diálogo expositivo: com três afirmações, uma das quais não guarda qualquer correlação com as anteriores, que explicam tudo o que aconteceu até agora, mas que o orçamento do filme foi insuficiente para mostrar através de imagens. O doutor afirma que precisa chamar Ted Nelson e manda a enfermeira verificar os sinais vitais do rapaz a cada quinze minutos. Cauteloso, o médico acrescenta que "é imperativo que isso permaneça em segredo". É tudo muito misterioso...
Pouco depois de ambos se retirarem, o paciente desperta, se solta e percebe que suas mãos estão cobertas de perebas. Frenético, ele corre para o espelho, tira as bandagens e se desespera ao perceber que está se decompondo... está se derretendo, eu diria. Daí o título. E sim, trata-se mesmo do astronauta com bigode de John Holmes (o qual permanece, apesar de toda a RADIATION, embora tragicamente mutilado pela metade). Está comprovado: eu sou a reencarnação de Sherlock Holmes.
A reação do rapaz não é serena: ele surta e sai quebrando tudo no quarto. A enfermeira tem o péssimo timing de entrar no recinto justamente nesse momento de desabafo e, demonstrando um sadio instinto de preservação, sai correndo. E aqui William Sachs mostra que é um Artista com "A" maiúsculo, brindando-nos com um momento mágico que explica nosso amor ao cinema: a fuga da enfermeira pelo corredor é filmada, sem nenhum motivo minimamente razoável, em câmera lenta, mostrando, de forma fascinante, os efeitos da gravidade sobre tecido adiposo, com gritos incessantes acompanhando a ação, fora de sincronia. E ninguém pode acusar a moça de falta de empenho: diferente do personagem médio de filme de terror, ela não se detém para abrir uma porta de vidro. Não! Como um desenho animado de carne e osso, a moça atravessa a vidraça e continua com sua fuga rua afora, gritando durante todo o tempo (isso que é fôlego!). O Melting Man (vou chamá-lo assim daqui por diante) continua a seguí-la, mas o filme não mostra o desfecho dessa perseguição implacável, deixando-nos imbuídos com a frustração que só um coito interrompido pode igualar.
Corta para uma ambulância a caminho do hospital e Dr. Black Power e o tal Ted Nelson, analisando o cadáver da enfermeira (aparentemente, o excesso de Big Macs consumidos ao longo dos anos foram mais decisivos na fuga do que o empenho da finada). Metade do rosto da moça foi arrancado e o cadáver está impregnado de radiotividade. Nelson, perspicaz, comenta que "ele não devia ter escapado" e Black Power acrescenta, com similar argúcia, que "eles não vão gostar disso". Não sei quem são "eles" (A NASA? Os militares? A família da moça? Ze Germans?), mas tenho certeza de que eles, de fato, não vão gostar disso. A conversa mole prossegue e eles decidem chamar o "General Perry", explicando que "Steve" fugiu, contando toda a história e acrescentando que Steve parece estar "ficando cada vez mais forte" (com base em que, não sei, mas eu não sou um cientista). Paráfrase da reação do general diante de tamanha ameaça: "tratem de encontrar esse porra". E bate o telefone na cara do cidadão. Presume-se que o General Perry não seja um paradigma da aptidão dos militares em lidar com situações emergenciais. Como postulava Aristóteles, puta que o pariu! Um psicopata radioativo matou uma enfermeira e fugiu do hospital e o plano do debilóide é mandar dois cientistas amanezados resolver a situação?
Enquanto isso, Melting Man está vagando por um matagal, grunhindo e deixando um rastro de gosma. O pegajoso encontra um pescador que, como todo personagem de filme de terror vagabundo que se depara com ruídos estranhos em um ambiente ermo, fica perguntando "quem está aí?".
Entrementes, mais conversa mole entre Black Power e Nelson, que comenta que a esposa está grávida , que o pobre Steve deve estar sofrendo muito e que seu cérebro deve estar completamente decomposto, despido de pensamento racional (Caralho! Eu jamais imaginaria essa possibilidade).
Comprovando a exatidão de tal tese, cortamos para a cabeça do pescador sendo jogada no rio.
O General Perry liga para Nelson, informando que está a caminho. A cena é mostrada num "split screen" ridículo, típico de câmeras de video dos anos 80 (aqueles tijolões do tamanho de uma bazuca), com uma barra verde entre as duas cenas.
Mostrando que sabe guardar segredo, Nelson, casualmente, conta a sua esposa toda a história de Steve, sempre com aquela mesma expressão típica de quem está sendo forçado a assistir um espisódio da "Turma do Didi". A cabeça do pescador, por sua vez, continua sua épica jornada rio abaixo, vivendo mil e uma aventuras e vendo coisas que jamais verá novamente, até cair de uma cascata. Uma pirralha que está brincando alegremente nos arredores acaba se deparando com Melting Man (ou "Mel", para os chegados, entendidos estes como pessoas que querem ter menos trabalho ao digitar um crítica), e sai correndo. Sua reação não é exagerada: Mel está cada vez menos formoso.
A pirralha corre por uns dois quilômetros, gritando mais que a porra, até encontrar sua mãe, para quem conta que viu "Frankenstein" no mato. A mãe acalma a pimpolha, dizendo que essas coisas não existem. Nelson, enquanto isso, está por aí, seguindo Mel (com a a ajuda de um contador Geiger e do rastro de carne decomposta deixado pelo monstro) e gritando que quer ajudá-lo, que ele não pode sobreviver sozinho e blábláblá. Tudo isso com aquele entusiasmo de sempre. Francamente, parece que o rapaz está procurando um cachorrinho perdido.
Cortamos para um casal que, aparentemente, está fazendo uma sessão de fotos. O jovem tenta convencer a moça a tirar a roupa para as fotos, levando a crer que ele está usando a "sessão" como desculpa para das uns pegas na beldade. Diante da resistência da jovenzinha, o cidadão resolver apelar para a coação, e, no empurra-empurra, eles acabam descobrindo o corpo decapitado do pescador.
Mas tudo vai ficar bem! Uma fanfarra militar acompanha a chegada triunfal do General Perry no aeroporto, onde encontra Nelson. O General, diga-se de passagem, não trouxe reforços e veio sozinho, usando uma indumentária típica de turista americano no Brasil. Nossas dúvidas sobre o "profissionalismo" desses heróis se agravam cada vez mais. Os dois saem à caçada num jipe amarelo do tempo da onça, constituindo nova evidência de que todo o orçamento do filme foi gasto com o trabalho de maquiagem de Rick Baker. A trilha sonora retumbante, contudo, tenta nos convencer de que momentos de intensa emoção estão por vir.
No meio do caminho, os dois mosqueteiros encontram um carro de polícia e uma ambulância e decidem investigar. É a cena onde foi encontrado o pescador sem cabeça. Nelson, que conhece o Xerife, pede para dar uma verificada no presunto, descobrindo que, além de arrancar a cabeça, Mel ainda brincou um pouco com as tripas do finado. Criativamente, Nelson sugere que se trata de um "ataque de animal selvagem", mas percebe-se pela expressão escrota do xerife que este não está comendo corda.
Experimentemos agora alguns momentos comoventes, enquanto Mel vaga, trôpego, pela mata, lembranças saudosas de sua gloriosa viagem ao espaço ecoando em sua mente. Tempo bom que não volta mais. E uma oportunidade para o filme encher linguiça e aumentar o tempo de duração sem despesas adicionais, reprisando cenas já gravadas.
Enquanto isso, Nelson está dando satisfações à patroa pelo telefone, enquanto Black Power e o General estão, aparentemente, coçando o saco e e resmungando sobre como "perderam a pista do miserável". Observação curiosa, pois, até agora, a única coisa que eles fizeram foi perguntar ao xerife sobre um defunto encontrado. É impressionante a seriedade com que os heróis estão tratando a situação. O General acaba aceitando o convite de Nelson para jantar na casa deste. Também convidados para o jantar estão a sogra de Nelson e um "amigo" desta.
O casal de velhinhos, ao que parece, é o temível comic relief do filme, despertando memórias dolorosas do Jar Jar Binks, do Orlando Jones em "Primeval" e daquele inglês da sobrancelha de taturana da série "A Múmia". Eles estão a caminho do jantar, regurgitando um diálogo insosso que parte da premissa de que nada é mais hilariante do que o romance na terceira idade. Resolvem parar no meio do caminho para roubar uns limões que encontraram na beira da estrada, e o roteiro continua com seu humor debilóide, com a velhinha fazendo exclamações sobre como a lua está linda e como o clima é romântico. Tudo isso ao som de uma trilha digna de um episódio de "Chaves", só que menos divertido. Para nosso alívio, Mel calha de estar nos arredores do limoeiro, ainda mais deformado. Assustados com os latidos de um cachorro, os velhinhos voltam para o carro. Quando eu já estou ficando frustrado, achando que o casal de malas vai escapar e salpicar o resto do filme com momentos de humor... SURPRESA! Melting Man está no banco de trás do carro, mostrando ao casal de idosos que gosta de pregar uma boa peça. A decomposição pode ter destruído seu corpo e sua capacidade de raciocinar, mas não seu senso de humor. Isso sim é que é comic relief.
Alheia a tudo isso, a mulher de Nelson está choramingando sobre suas preocupações com o atraso da mamãe, já que Steve está por aí surtando e tudo mais. O cientista, com o vigor de sempre, assegura que "deve haver uma explicação simples" para o atraso. Mas aflora o conflito: o General Perry escuta a conversa e tenta dar um puxão de orelha no cientista, já que, evidentemente, este deu com a língua nos dentes para a esposa sobre a "crise". O esporro do general sai pela culatra, pois a Sra. Nelson passa na cara dele o teria ocorrido a qualquer pessoa com um mínimo de bom senso: que essa "caça ao monstro" é o troço mais esfarrapado que ela já viu. "O que vocês esperam? Que ele venha bater em nossa porta?" E manda os dois orebas pararem de coçar o saco e continuarem a buscar o monstro. Ambos obedecem, rabos firmemente plantados entre as pernas. Sem, contudo, convocar soldados, a polícia, o FBI nem nada do tipo. É, isso vai dar um resultado da porra. A estratégia da dupla dinâmica continua a mesma: sair dirigindo no jipão amarelo, na esperança de topar com Melting Man por coincidência.
Mais momentos de drama com o pegajoso, que agora está em um cemitério, relembrando a viagem ao espaço.
Mais conversa mole entre Nelson e o General.
Por essa eu não esperava! Melting Man acaba indo parar na casa de Nelson! Ouvindo o barulho de uma vidraça sendo partida, a Sra. Nelson vai investigar e acaba descobrindo que era só a gatinha do casal, que havia derrubado sua tigela de leite. Enquanto a moça limpa a sujeira, um vulto se aproxima por trás e... é Nelson, numa cena de susto das mais originais. Cacete, eu fiquei com o coração na mão!
O xerife encontra o carro dos velhinhos e descobre o serviço do Melting Man. Por motivos inexplicáveis, a primeira atitude do agente da lei é entrar em contato com Nelson (e não, digamos, com o legista ou a polícia científica), corroborando as suspeitas da esposa deste. Nelson deixa a esposa sedada, sob a proteção do general, e vai ao encontro do xerife.
Enquanto isso, sem nenhum motivo o plausível para tal, o xerife ameaça prender Nelson por estar "acobertando o criminoso". Nelson acaba contando toda a história, após obter a promessa de que o xerife (Neil é o nome do cidadão) não conte a ninguém. E lá vão eles continuar a inepta caçada ao monstro.
O general, nesse ínterim, está despreocupadamente batendo um rango na casa de Nelson. Do nada, ele resolve sair, aparentemente para admirar o luar (porra... não dava para criar uma situação mais fácil de engolir? Admirar o luar?), abre a porta e...
Nelson e o xerife resolvem passar na casa do cientista para dar uma verificada no estado da patroa (que, finalmente descobri, se chama Judy) e e encontram o que sobrou de Perry. Mel resolve bater estrategicamente em retirada.
Na próxima cena, um casal de idiotas que está voltando do cinema encontra a porta de casa aberta, a maçaneta coberta por uma meleca avermelhada. Não ganha prêmio nenhum quem adivinhar quem entrou aqui. O cara (Matt, que, veja você, é interpretado por Jonathan Demme) resolve entrar para "investigar" o que está havendo, enquando a mocinha fica esperando do lado de fora. Impaciente com a demora de sua cara-metade, ela resolve entrar, constatando que a casa está completamente revirada e que... bom, o filme não mostra, mas pelo barulho e a reação da moça, é óbvio que ela vê Mel fazendo alguma coisa desagradável com Matt. Ela se tranca na cozinha, barra a porta com a geladeira, liga para a polícia e se arma com um cutelo. Ao que parece, contudo, a decomposição não afetou tanto assim a capacidade de raciocínio do Melting Man, pois, enquanto a moça se prepara o ataque, Mel contorna o obstáculo e ataca pela janela, demonstrando, mais uma vez, que é praticamente um ninja.
A mocinha (Nell), contudo, não entrega os pontos e acerta um golpe de cutelo no braço de Mel, decepando o membro de infeliz monstro em decomposição.
Melting Man foge e Nell passa uns vinte segundos dando um faniquito. Um retrato realista dos efeitos do stress pós-traumático ou só mais uma maneira de prolongar artificialmente a duração do filme? Você decide.
Informado do pedido de socorro de Nell, o xerife parte em busca do monstro. Enquanto os dois manés chegam na casa da moça, o monstro já partiu para outra vizinhança, deixando atrás de si um rastro de gosma, que é seguido por nossos heróis. A perseguição frenética (leia-se, tranquila caminhada pela linha de trem, seguindo a meleca), conduz os dois a Melting Man, que está chegando numa fábrica ou refinaria... sei lá, uma estrutura industrial. O xerife saca sua arma, mas Nelson, em mais um momento sem noção do roteiro, o impede de dar cabo do monstro. O xerife dá um tiro para cima; Melting Man, mostrando que não é otário, pica a mula fábrica adentro. Após uma caçada das menos intensas (é sério, parece uma brincadeira de esconde-esconde), Nelson, mais uma vez sem nenhuma base (e isso que o sujeito é um cientista) deduz que "ele parece estar ficando mais forte à medida que derrete! Temos que descobrir por que!". Num plano nada manjado, os dois resolvem se separar para efetuar a busca com mais eficiência (ou seja, um dos dois vai ser encurralado pelo monstro e morrer). Nelson, sabe-se lá por que, joga sua arma fora. Já desisti de entender as motivações do sujeito. A partir de agora, vou partir da premissa de que ele simplesmente é imbecil e pronto.
Finalmente, após vários closes de pés subindos escadarias, os dois heróis encurralam o monstro no topo de uma torre. Inacreditavelmente, o xerife, que está com uma espingarda apontada para Melting Man, ao invés de fazer o óbvio (disparar vários tirambaços na cabeça do bicho), fica perguntando a Nelson o que fazer. Quando o monstro finalmente parte para cima dele, o retardado resolve disparar, mas aí o barco já zarpou: apesar de baleado, o monstro agarra Neil. Enquanto o pau come, Nelson se limita a ficar choramingando, sem muita convicção: "Steve, pare. Já chega." (Só faltou ele dizer, "deixa disso, os cara") até que Melting Man acaba jogando o xerife da torre. O infeliz homem da lei calha de cair sobre um monte de fios de alta tensão, resultando numa morte literalmente pirotécnica.
Dois vigilantes da fábrica, que, numa cena anterior que não mencionei, encontraram rastros da gosma de Melting Man, se aproximam da torre.
Nelson, confrontado por Mel, tenta argumentar com o monstro, com previsível sucesso (Mel joga o rapaz por cima de um dos corrimões da torre). Segurando-se no corrimão, Nelson tenta apelar para o sentimentalismo, gritando reiteradamente que "Steve! Sou eu! Ted Nelson! Se u amigo! Eu estou caindo! Me ajude! Eu faço um boquete!" Certo, a última eu inventei. E, num comovente momento que vai trazer lágrimas aos olhos do espectador, Melting Man, demonstrando que ainda resta algo de sua humanidade no âmago de seu aspecto horripilante, acaba salvando o zeba.
Tragicamente, os vigilantes chegam à torre no momento em que o dramático resgate está ocorrendo. A despeito dos apelos de Nelson, eles acabam abrindo fogo e matando o cientista, mas não o monstro, que dá cabo dos dois. Ok, eu admito que essa foi realmente surpreendente. Tenho certeza que, na cabeça do diretor, foi uma tentativa retardada de passar alguma mensagem pacifista, mas a morte casual do "herói" foi supreendente mesmo assim.
Melting Man sai da fábrica cambaleando e se derretendo cada vez mais, lembranças da viagem a Saturno e daquele singular e perfeito momento em que ele viu o sol "como ninguém jamais o havia visto", ressonando em sua mente, até se derreter completamente. Bem, pode-se acusar o filme de tudo, menos de publicidade enganosa.
Enquanto cenas das consequências nefastas da viagem anterior se passam (Nelson morto na escadaria, os seguranças, o xerife eletrocutado), ouvimos uma jornalista anunciando o lançamento de mais uma nave em missão a Saturno, e o filme se encerra com stock footage de um foguete sendo lançado e de mais cenas cenas de borrões multicoloridos, intercalados com as imagens de um zelador jogado a meleca que restou do Melting Man numa lixeira.
Tudo bem, talvez eu não fosse uma criança tão idiota. O filme certamente é uma porcaria, mas não deixa de ser divertido. O elenco é uniformemente péssimo, a fotografia é do nível de uma novela da globo e a "estratégia" dos heróis para capturar o monstro é completamente ridícula (Cadê o exército? O Perry não é general? E o resto da polícia?) deixando claro que minha tese sobre a destinação do orçamento não era piada. O roteiro era praticamente inexistente - basicamente, pode ser resumido como "cara vai ao espaço, vira monstro, sai matando umas pessoas aleatoriamente, é seguido por um cientista, um general e um xerife e acaba se derretendo no final". Mas a maquiagem da criatura é muito boa e extremamente asquerosa (claro, todo o dinheiro do filme foi pro bolso do Rick Baker), os diálogos são de uma ruindade sublime (mais artificiais que o Leão Lobo tentando seduzir a Juliana Paes), os dois velhinhos "cômicos" viram comida de monstro e o final é genuinamente desagradável, com aquele clima de "shit happens" que permeava o cinema de horror dos anos 70. E, claro, temos três momentos mágicos, cuja beleza não pode ser descrita em meras palavras. Senhoras e senhores, contemplem o esplendor de "Enfermeira em Fuga", "Cabeça à Deriva" e "O Incrível Xerife que Explodiu".
O filme se inicia com uma série de borrões de diversas cores e, em seguida, o brilho das estrelas, indicando, sutilmente, o lançamento e viagem de uma espaçonave, a Scorpio 5. Passam-se os créditos do filme, através dos quais descobrimos que a maquiagem (e, provavelmente, toda a despesas do orçamento da produção) ficou por conta de Rick Baker.
Três astronautas deitados em um tosco set "hi-tech", comunicam que estão adentrando "os anéis de Saturno". Um deles: "Ninguém jamais viu algo assim!" e o filme corta para algo que não sei se é uma maquete vagabunda ou stock footage chibunga de um satélite orbitando em torno de algo que parece ser uma superfície cinzenta. O satélite fuleiro é intercalado com cenas dos astronautas apertando botões (essa tal de tecnologia é um negócio fabuloso) e trocando , com a base, mensagens que definem "função fática da linguagem", até que um deles, titular de um bigode digno de ator pornô dos anos 70, não se contém e exclama: "Magnífico! Você nunca viu nada até ver o sol através dos anéis de Saturno!" A empolgação da assertiva destoa da expressão do rapaz, típica de quem precisa urgentemente satisfazer necessidades fisiológicas. Tamanha hipérbole nos deixa aguardando um visual espetacular, mas , ao invés disso, somos fulminados por um firme chute nos testículos: o "sol visto através dos anéis de Saturno" é só uma bola (aliás, uma esfera pela metade) cor-de-laranja opaca, o que nos leva a crer que o astronauta entusiasmado nunca se dedicou muito ao turismo.
Mais uma série de borrões avermelhados de significado dúbio surgem na tela. Presumimos que os borrões significam a aterrissagem da nave em Saturno. Mais alguns borrões ocupam a tela e,
em seguida, o cosmonauta com excesso de entusiasmo é mostrado fazendo caretas, com um filete de sangue escorrendo pelo nariz. São duas as alternativas: ou a aterrissagem não correu às mil maravilhas (nem poderia, afinal, conforme meus exaustivos estudos de astronomia [isto é, dei uma olhada em "Saturno" na wikipedia] 97% do planeta é gasoso) ou a ânsia do rapaz em satisfazer suas necessidades fisiológicas estão ainda mais prementes. Qualquer das hipóteses é prenúncio de desgraça.
Nada é explicitado, pois o filme corta para um quarto de hospital, onde uma enfermeira bem-alimentada e um médico black power verificam a situação de um paciente mumificado por bandagens. o prontuário do paciente está ilegível, exceto por um "RADIATION" em letras garrafais vermelhas. Como minha resenha de "Drácula vs Frankenstein" já demonstrou, meus poderes de dedução são notáveis, de modo que vou adivinhar o que se passa aqui: 1) o paciente é o astronauta outrora empolgado e intestinalmente comprometido, 2) ocorreu algum imprevisto na aterrissagem que resultou no atual quadro clínico e 3) ele é o único sobrevivente. O médico explica que nada está adiantando, que ele nunca viu nada assim antes e que não entende por que ele (o paciente, não o médico) foi o único sobrevivente. É assim que se escreve diálogo expositivo: com três afirmações, uma das quais não guarda qualquer correlação com as anteriores, que explicam tudo o que aconteceu até agora, mas que o orçamento do filme foi insuficiente para mostrar através de imagens. O doutor afirma que precisa chamar Ted Nelson e manda a enfermeira verificar os sinais vitais do rapaz a cada quinze minutos. Cauteloso, o médico acrescenta que "é imperativo que isso permaneça em segredo". É tudo muito misterioso...
Pouco depois de ambos se retirarem, o paciente desperta, se solta e percebe que suas mãos estão cobertas de perebas. Frenético, ele corre para o espelho, tira as bandagens e se desespera ao perceber que está se decompondo... está se derretendo, eu diria. Daí o título. E sim, trata-se mesmo do astronauta com bigode de John Holmes (o qual permanece, apesar de toda a RADIATION, embora tragicamente mutilado pela metade). Está comprovado: eu sou a reencarnação de Sherlock Holmes.
A reação do rapaz não é serena: ele surta e sai quebrando tudo no quarto. A enfermeira tem o péssimo timing de entrar no recinto justamente nesse momento de desabafo e, demonstrando um sadio instinto de preservação, sai correndo. E aqui William Sachs mostra que é um Artista com "A" maiúsculo, brindando-nos com um momento mágico que explica nosso amor ao cinema: a fuga da enfermeira pelo corredor é filmada, sem nenhum motivo minimamente razoável, em câmera lenta, mostrando, de forma fascinante, os efeitos da gravidade sobre tecido adiposo, com gritos incessantes acompanhando a ação, fora de sincronia. E ninguém pode acusar a moça de falta de empenho: diferente do personagem médio de filme de terror, ela não se detém para abrir uma porta de vidro. Não! Como um desenho animado de carne e osso, a moça atravessa a vidraça e continua com sua fuga rua afora, gritando durante todo o tempo (isso que é fôlego!). O Melting Man (vou chamá-lo assim daqui por diante) continua a seguí-la, mas o filme não mostra o desfecho dessa perseguição implacável, deixando-nos imbuídos com a frustração que só um coito interrompido pode igualar.
Corta para uma ambulância a caminho do hospital e Dr. Black Power e o tal Ted Nelson, analisando o cadáver da enfermeira (aparentemente, o excesso de Big Macs consumidos ao longo dos anos foram mais decisivos na fuga do que o empenho da finada). Metade do rosto da moça foi arrancado e o cadáver está impregnado de radiotividade. Nelson, perspicaz, comenta que "ele não devia ter escapado" e Black Power acrescenta, com similar argúcia, que "eles não vão gostar disso". Não sei quem são "eles" (A NASA? Os militares? A família da moça? Ze Germans?), mas tenho certeza de que eles, de fato, não vão gostar disso. A conversa mole prossegue e eles decidem chamar o "General Perry", explicando que "Steve" fugiu, contando toda a história e acrescentando que Steve parece estar "ficando cada vez mais forte" (com base em que, não sei, mas eu não sou um cientista). Paráfrase da reação do general diante de tamanha ameaça: "tratem de encontrar esse porra". E bate o telefone na cara do cidadão. Presume-se que o General Perry não seja um paradigma da aptidão dos militares em lidar com situações emergenciais. Como postulava Aristóteles, puta que o pariu! Um psicopata radioativo matou uma enfermeira e fugiu do hospital e o plano do debilóide é mandar dois cientistas amanezados resolver a situação?
Enquanto isso, Melting Man está vagando por um matagal, grunhindo e deixando um rastro de gosma. O pegajoso encontra um pescador que, como todo personagem de filme de terror vagabundo que se depara com ruídos estranhos em um ambiente ermo, fica perguntando "quem está aí?".
Entrementes, mais conversa mole entre Black Power e Nelson, que comenta que a esposa está grávida , que o pobre Steve deve estar sofrendo muito e que seu cérebro deve estar completamente decomposto, despido de pensamento racional (Caralho! Eu jamais imaginaria essa possibilidade).
Comprovando a exatidão de tal tese, cortamos para a cabeça do pescador sendo jogada no rio.
O General Perry liga para Nelson, informando que está a caminho. A cena é mostrada num "split screen" ridículo, típico de câmeras de video dos anos 80 (aqueles tijolões do tamanho de uma bazuca), com uma barra verde entre as duas cenas.
Mostrando que sabe guardar segredo, Nelson, casualmente, conta a sua esposa toda a história de Steve, sempre com aquela mesma expressão típica de quem está sendo forçado a assistir um espisódio da "Turma do Didi". A cabeça do pescador, por sua vez, continua sua épica jornada rio abaixo, vivendo mil e uma aventuras e vendo coisas que jamais verá novamente, até cair de uma cascata. Uma pirralha que está brincando alegremente nos arredores acaba se deparando com Melting Man (ou "Mel", para os chegados, entendidos estes como pessoas que querem ter menos trabalho ao digitar um crítica), e sai correndo. Sua reação não é exagerada: Mel está cada vez menos formoso.
A pirralha corre por uns dois quilômetros, gritando mais que a porra, até encontrar sua mãe, para quem conta que viu "Frankenstein" no mato. A mãe acalma a pimpolha, dizendo que essas coisas não existem. Nelson, enquanto isso, está por aí, seguindo Mel (com a a ajuda de um contador Geiger e do rastro de carne decomposta deixado pelo monstro) e gritando que quer ajudá-lo, que ele não pode sobreviver sozinho e blábláblá. Tudo isso com aquele entusiasmo de sempre. Francamente, parece que o rapaz está procurando um cachorrinho perdido.
Cortamos para um casal que, aparentemente, está fazendo uma sessão de fotos. O jovem tenta convencer a moça a tirar a roupa para as fotos, levando a crer que ele está usando a "sessão" como desculpa para das uns pegas na beldade. Diante da resistência da jovenzinha, o cidadão resolver apelar para a coação, e, no empurra-empurra, eles acabam descobrindo o corpo decapitado do pescador.
Mas tudo vai ficar bem! Uma fanfarra militar acompanha a chegada triunfal do General Perry no aeroporto, onde encontra Nelson. O General, diga-se de passagem, não trouxe reforços e veio sozinho, usando uma indumentária típica de turista americano no Brasil. Nossas dúvidas sobre o "profissionalismo" desses heróis se agravam cada vez mais. Os dois saem à caçada num jipe amarelo do tempo da onça, constituindo nova evidência de que todo o orçamento do filme foi gasto com o trabalho de maquiagem de Rick Baker. A trilha sonora retumbante, contudo, tenta nos convencer de que momentos de intensa emoção estão por vir.
No meio do caminho, os dois mosqueteiros encontram um carro de polícia e uma ambulância e decidem investigar. É a cena onde foi encontrado o pescador sem cabeça. Nelson, que conhece o Xerife, pede para dar uma verificada no presunto, descobrindo que, além de arrancar a cabeça, Mel ainda brincou um pouco com as tripas do finado. Criativamente, Nelson sugere que se trata de um "ataque de animal selvagem", mas percebe-se pela expressão escrota do xerife que este não está comendo corda.
Experimentemos agora alguns momentos comoventes, enquanto Mel vaga, trôpego, pela mata, lembranças saudosas de sua gloriosa viagem ao espaço ecoando em sua mente. Tempo bom que não volta mais. E uma oportunidade para o filme encher linguiça e aumentar o tempo de duração sem despesas adicionais, reprisando cenas já gravadas.
Enquanto isso, Nelson está dando satisfações à patroa pelo telefone, enquanto Black Power e o General estão, aparentemente, coçando o saco e e resmungando sobre como "perderam a pista do miserável". Observação curiosa, pois, até agora, a única coisa que eles fizeram foi perguntar ao xerife sobre um defunto encontrado. É impressionante a seriedade com que os heróis estão tratando a situação. O General acaba aceitando o convite de Nelson para jantar na casa deste. Também convidados para o jantar estão a sogra de Nelson e um "amigo" desta.
O casal de velhinhos, ao que parece, é o temível comic relief do filme, despertando memórias dolorosas do Jar Jar Binks, do Orlando Jones em "Primeval" e daquele inglês da sobrancelha de taturana da série "A Múmia". Eles estão a caminho do jantar, regurgitando um diálogo insosso que parte da premissa de que nada é mais hilariante do que o romance na terceira idade. Resolvem parar no meio do caminho para roubar uns limões que encontraram na beira da estrada, e o roteiro continua com seu humor debilóide, com a velhinha fazendo exclamações sobre como a lua está linda e como o clima é romântico. Tudo isso ao som de uma trilha digna de um episódio de "Chaves", só que menos divertido. Para nosso alívio, Mel calha de estar nos arredores do limoeiro, ainda mais deformado. Assustados com os latidos de um cachorro, os velhinhos voltam para o carro. Quando eu já estou ficando frustrado, achando que o casal de malas vai escapar e salpicar o resto do filme com momentos de humor... SURPRESA! Melting Man está no banco de trás do carro, mostrando ao casal de idosos que gosta de pregar uma boa peça. A decomposição pode ter destruído seu corpo e sua capacidade de raciocinar, mas não seu senso de humor. Isso sim é que é comic relief.
Alheia a tudo isso, a mulher de Nelson está choramingando sobre suas preocupações com o atraso da mamãe, já que Steve está por aí surtando e tudo mais. O cientista, com o vigor de sempre, assegura que "deve haver uma explicação simples" para o atraso. Mas aflora o conflito: o General Perry escuta a conversa e tenta dar um puxão de orelha no cientista, já que, evidentemente, este deu com a língua nos dentes para a esposa sobre a "crise". O esporro do general sai pela culatra, pois a Sra. Nelson passa na cara dele o teria ocorrido a qualquer pessoa com um mínimo de bom senso: que essa "caça ao monstro" é o troço mais esfarrapado que ela já viu. "O que vocês esperam? Que ele venha bater em nossa porta?" E manda os dois orebas pararem de coçar o saco e continuarem a buscar o monstro. Ambos obedecem, rabos firmemente plantados entre as pernas. Sem, contudo, convocar soldados, a polícia, o FBI nem nada do tipo. É, isso vai dar um resultado da porra. A estratégia da dupla dinâmica continua a mesma: sair dirigindo no jipão amarelo, na esperança de topar com Melting Man por coincidência.
Mais momentos de drama com o pegajoso, que agora está em um cemitério, relembrando a viagem ao espaço.
Mais conversa mole entre Nelson e o General.
Por essa eu não esperava! Melting Man acaba indo parar na casa de Nelson! Ouvindo o barulho de uma vidraça sendo partida, a Sra. Nelson vai investigar e acaba descobrindo que era só a gatinha do casal, que havia derrubado sua tigela de leite. Enquanto a moça limpa a sujeira, um vulto se aproxima por trás e... é Nelson, numa cena de susto das mais originais. Cacete, eu fiquei com o coração na mão!
O xerife encontra o carro dos velhinhos e descobre o serviço do Melting Man. Por motivos inexplicáveis, a primeira atitude do agente da lei é entrar em contato com Nelson (e não, digamos, com o legista ou a polícia científica), corroborando as suspeitas da esposa deste. Nelson deixa a esposa sedada, sob a proteção do general, e vai ao encontro do xerife.
Enquanto isso, sem nenhum motivo o plausível para tal, o xerife ameaça prender Nelson por estar "acobertando o criminoso". Nelson acaba contando toda a história, após obter a promessa de que o xerife (Neil é o nome do cidadão) não conte a ninguém. E lá vão eles continuar a inepta caçada ao monstro.
O general, nesse ínterim, está despreocupadamente batendo um rango na casa de Nelson. Do nada, ele resolve sair, aparentemente para admirar o luar (porra... não dava para criar uma situação mais fácil de engolir? Admirar o luar?), abre a porta e...
Nelson e o xerife resolvem passar na casa do cientista para dar uma verificada no estado da patroa (que, finalmente descobri, se chama Judy) e e encontram o que sobrou de Perry. Mel resolve bater estrategicamente em retirada.
Na próxima cena, um casal de idiotas que está voltando do cinema encontra a porta de casa aberta, a maçaneta coberta por uma meleca avermelhada. Não ganha prêmio nenhum quem adivinhar quem entrou aqui. O cara (Matt, que, veja você, é interpretado por Jonathan Demme) resolve entrar para "investigar" o que está havendo, enquando a mocinha fica esperando do lado de fora. Impaciente com a demora de sua cara-metade, ela resolve entrar, constatando que a casa está completamente revirada e que... bom, o filme não mostra, mas pelo barulho e a reação da moça, é óbvio que ela vê Mel fazendo alguma coisa desagradável com Matt. Ela se tranca na cozinha, barra a porta com a geladeira, liga para a polícia e se arma com um cutelo. Ao que parece, contudo, a decomposição não afetou tanto assim a capacidade de raciocínio do Melting Man, pois, enquanto a moça se prepara o ataque, Mel contorna o obstáculo e ataca pela janela, demonstrando, mais uma vez, que é praticamente um ninja.
A mocinha (Nell), contudo, não entrega os pontos e acerta um golpe de cutelo no braço de Mel, decepando o membro de infeliz monstro em decomposição.
Melting Man foge e Nell passa uns vinte segundos dando um faniquito. Um retrato realista dos efeitos do stress pós-traumático ou só mais uma maneira de prolongar artificialmente a duração do filme? Você decide.
Informado do pedido de socorro de Nell, o xerife parte em busca do monstro. Enquanto os dois manés chegam na casa da moça, o monstro já partiu para outra vizinhança, deixando atrás de si um rastro de gosma, que é seguido por nossos heróis. A perseguição frenética (leia-se, tranquila caminhada pela linha de trem, seguindo a meleca), conduz os dois a Melting Man, que está chegando numa fábrica ou refinaria... sei lá, uma estrutura industrial. O xerife saca sua arma, mas Nelson, em mais um momento sem noção do roteiro, o impede de dar cabo do monstro. O xerife dá um tiro para cima; Melting Man, mostrando que não é otário, pica a mula fábrica adentro. Após uma caçada das menos intensas (é sério, parece uma brincadeira de esconde-esconde), Nelson, mais uma vez sem nenhuma base (e isso que o sujeito é um cientista) deduz que "ele parece estar ficando mais forte à medida que derrete! Temos que descobrir por que!". Num plano nada manjado, os dois resolvem se separar para efetuar a busca com mais eficiência (ou seja, um dos dois vai ser encurralado pelo monstro e morrer). Nelson, sabe-se lá por que, joga sua arma fora. Já desisti de entender as motivações do sujeito. A partir de agora, vou partir da premissa de que ele simplesmente é imbecil e pronto.
Finalmente, após vários closes de pés subindos escadarias, os dois heróis encurralam o monstro no topo de uma torre. Inacreditavelmente, o xerife, que está com uma espingarda apontada para Melting Man, ao invés de fazer o óbvio (disparar vários tirambaços na cabeça do bicho), fica perguntando a Nelson o que fazer. Quando o monstro finalmente parte para cima dele, o retardado resolve disparar, mas aí o barco já zarpou: apesar de baleado, o monstro agarra Neil. Enquanto o pau come, Nelson se limita a ficar choramingando, sem muita convicção: "Steve, pare. Já chega." (Só faltou ele dizer, "deixa disso, os cara") até que Melting Man acaba jogando o xerife da torre. O infeliz homem da lei calha de cair sobre um monte de fios de alta tensão, resultando numa morte literalmente pirotécnica.
Dois vigilantes da fábrica, que, numa cena anterior que não mencionei, encontraram rastros da gosma de Melting Man, se aproximam da torre.
Nelson, confrontado por Mel, tenta argumentar com o monstro, com previsível sucesso (Mel joga o rapaz por cima de um dos corrimões da torre). Segurando-se no corrimão, Nelson tenta apelar para o sentimentalismo, gritando reiteradamente que "Steve! Sou eu! Ted Nelson! Se u amigo! Eu estou caindo! Me ajude! Eu faço um boquete!" Certo, a última eu inventei. E, num comovente momento que vai trazer lágrimas aos olhos do espectador, Melting Man, demonstrando que ainda resta algo de sua humanidade no âmago de seu aspecto horripilante, acaba salvando o zeba.
Tragicamente, os vigilantes chegam à torre no momento em que o dramático resgate está ocorrendo. A despeito dos apelos de Nelson, eles acabam abrindo fogo e matando o cientista, mas não o monstro, que dá cabo dos dois. Ok, eu admito que essa foi realmente surpreendente. Tenho certeza que, na cabeça do diretor, foi uma tentativa retardada de passar alguma mensagem pacifista, mas a morte casual do "herói" foi supreendente mesmo assim.
Melting Man sai da fábrica cambaleando e se derretendo cada vez mais, lembranças da viagem a Saturno e daquele singular e perfeito momento em que ele viu o sol "como ninguém jamais o havia visto", ressonando em sua mente, até se derreter completamente. Bem, pode-se acusar o filme de tudo, menos de publicidade enganosa.
Enquanto cenas das consequências nefastas da viagem anterior se passam (Nelson morto na escadaria, os seguranças, o xerife eletrocutado), ouvimos uma jornalista anunciando o lançamento de mais uma nave em missão a Saturno, e o filme se encerra com stock footage de um foguete sendo lançado e de mais cenas cenas de borrões multicoloridos, intercalados com as imagens de um zelador jogado a meleca que restou do Melting Man numa lixeira.
Tudo bem, talvez eu não fosse uma criança tão idiota. O filme certamente é uma porcaria, mas não deixa de ser divertido. O elenco é uniformemente péssimo, a fotografia é do nível de uma novela da globo e a "estratégia" dos heróis para capturar o monstro é completamente ridícula (Cadê o exército? O Perry não é general? E o resto da polícia?) deixando claro que minha tese sobre a destinação do orçamento não era piada. O roteiro era praticamente inexistente - basicamente, pode ser resumido como "cara vai ao espaço, vira monstro, sai matando umas pessoas aleatoriamente, é seguido por um cientista, um general e um xerife e acaba se derretendo no final". Mas a maquiagem da criatura é muito boa e extremamente asquerosa (claro, todo o dinheiro do filme foi pro bolso do Rick Baker), os diálogos são de uma ruindade sublime (mais artificiais que o Leão Lobo tentando seduzir a Juliana Paes), os dois velhinhos "cômicos" viram comida de monstro e o final é genuinamente desagradável, com aquele clima de "shit happens" que permeava o cinema de horror dos anos 70. E, claro, temos três momentos mágicos, cuja beleza não pode ser descrita em meras palavras. Senhoras e senhores, contemplem o esplendor de "Enfermeira em Fuga", "Cabeça à Deriva" e "O Incrível Xerife que Explodiu".
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